Em um novo capítulo da crescente tensão geopolítica no Caribe, Nicolás Maduro convocou neste fim de semana os países membros da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (ALBA) a uma "resistência unida, popular e prolongada" diante do despliegue militar dos Estados Unidos na região.
A proposta foi lançada durante a XXV Cúpula do ALBA, realizada de forma virtual e transmitida pela Venezolana de Televisión, em ocasião dos 21 anos da fundação do bloco regional.
“Unamos a resistência unida, popular e prolongada dos povos do ALBA com a ofensiva permanente de construção de bases sólidas em uma economia conjunta, comum, cooperativa e de benefício mútuo”, proclamou o governante venezuelano.
Paralelamente, denunciou que a operação militar americana - voltada para o combate ao narcotráfico - constitui na verdade uma ameaça direta para a estabilidade regional e uma tentativa de forçar uma mudança de regime em Caracas.
Maduro assegurou que já se completam “25 semanas de agressão, terrorismo psicológico, de ameaça militar” por parte de Washington.
A seu juízo, esse contexto exigiu o aprimoramento de um sistema de defesa nacional inspirado em figuras históricas da resistência indígena e da luta pela liberdade latino-americana, como Guaicaipuro e Simón Bolívar.
“Pretendem um novo projeto colonizador, mas não passarão, seremos livres”, insistiu.
O mandatário também classificou de “assalto pirata e sequestro” a recente apreensão de um petroleiro venezuelano por parte dos Estados Unidos perto das águas territoriais venezuelanas.
Segundo Maduro, esta ação marca a “ruptura total das vias legais e diplomáticas de convivência no hemisfério”, e faz parte de uma estratégia de desestabilização que transcende o local para se tornar um “projeto colonizador não apenas contra a América, mas contra o mundo inteiro”.
O contexto do desdobramento militar americano
O governo dos Estados Unidos intensificou sua presença militar no Caribe desde o meio do ano, sob a justificativa de combater o narcotráfico.
No entanto, analistas do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS) alertam que se trata do maior despliegue aeronaval dos Estados Unidos desde a primeira Guerra do Golfo, o que tem sido interpretado por Caracas como uma clara "ameaça de invasão".
Em paralelo, a Venezuela tem mantido uma mobilização militar constante em todo o seu território, como parte de sua estratégia defensiva.
Maduro acusa Washington de usar o pretexto do narcotráfico para lançar uma ofensiva geopolítica contra governos que se opõem a ele, especialmente o seu, que não reconhece como legítimo e vincula ao chamado "Cartel de los Soles".
Cuba: Apoio firme à Venezuela e rejeição ao “hegemonismo”
Miguel Díaz-Canel, em uma intervenção por videoconferência, apoiou firmemente a denúncia venezuelana e convocou à unidade do ALBA “para enfrentar com firmeza a pretensão hegemônica do Governo dos Estados Unidos.”
Condenou a presença “ostensiva, exagerada e injustificada” de forças navais estadunidenses no mar do Caribe e advertiu que a ameaça militar deliberada “deve colocar em alerta todos os povos e governos do continente”.
Díaz-Canel qualificou a apreensão do navio petroleiro venezuelano como "um ato de pirataria e roubo dos recursos do povo venezuelano que constitui uma grave violação do direito internacional".
Também acusou os Estados Unidos de não ter um verdadeiro interesse no combate ao narcotráfico, mas de usá-lo como pretexto para expandir seu controle político sobre a América Latina e o Caribe.
“Não somos o quintal de ninguém, somos países soberanos. A doutrina Monroe saiu do armário”, sentenciou.
Cúpula virtual, tensões reais
Longe dos encontros presenciais de outros tempos, a XXV Cúpula do ALBA foi um evento digital com um claro tom defensivo e retórico.
As restrições logísticas decorrentes do desdobramento militar americano levaram os mandatários a se conectarem por videoconferência.
Entre eles, o presidente nicaraguense Daniel Ortega, acompanhado de sua esposa e copresidenta Rosario Murillo, que também fez críticas ao Ocidente e à União Europeia por seu apoio à Ucrânia no conflito com a Rússia.
"Vemos a UE tocando tambores de guerra, metendo-se a favor dos nazistas da Ucrânia contra a Federação Russa", disse Ortega, em uma intervenção carregada de referências ideológicas e alinhada com os interesses do Kremlin.
Nicarágua, Cuba e Venezuela continuam sendo os principais pilares do ALBA após a recente saída da Bolívia do bloco, uma perda significativa marcada por uma mudança de rumo político naquele país e pela prisão preventiva do ex-presidente Luis Arce.
Como fechamento, os mandatários exigiram o “cessar imediato da ameaça militar” no Caribe e condenaram veemente as estratégias de segurança promovidas por Washington.
O documento final da cúpula refletiu uma posição comum de rejeição ao que consideram uma escalada militar injustificada que ameaça a paz regional.
A cúpula se transformou assim em uma plataforma para relançar a narrativa anti-imperialista do eixo Caracas-Havana-Manágua, com um discurso que misturou o legado histórico de resistência com denúncias atuais de intervenção estrangeira.
Apesar do desgaste institucional da ALBA e da crescente pressão internacional, seus membros insistem em seu direito à soberania e a resistir a qualquer tentativa de intervenção externa.
“Até a vitória, sempre! Vitória, vitória, vitória!”, concluiu Maduro, em um encerramento que buscou evocar a retórica revolucionária de décadas passadas, mas que ocorre em um cenário internacional cada vez mais adverso e com menos aliados firmes no hemisfério.
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