Em maio de 2025, o regime cubano prometeu que os apagões durante o verão não superariam quatro horas diárias por cliente.
A afirmação, feita pelo vice-ministro primeiro do ministério de Energia e Minas (MINEM), Argelio Jesús Abad Vigoa, foi publicada em 21 de maio em Granma, o órgão oficial do Partido Comunista de Cuba. A intenção era clara: reduzir o mal-estar social às vésperas do período mais quente do ano.
Segundo essa promessa, o plano consistia em aumentar a geração em 13 GWh diários, recuperar unidades térmicas chave —como Felton 2, Mariel 7, Nuevitas 4 e Renté 4— e controlar o crescimento do consumo.
Apesar de que os próprios dados oficiais já mostravam que a geração disponível seria insuficiente (1.120 MW frente a uma demanda que superava os 3.000 MW, mesmo de madrugada), manteve-se a narrativa do "verão com apenas quatro horas de apagão".
No entanto, a população já sofria com apagões diários que em muitos casos ultrapassavam as 12 horas, afetavam o cozimento de alimentos, deterioravam os eletrodomésticos e obrigavam muitas famílias a dormir na rua para escapar do calor.
Isso, sem contar os colapsos totais do Sistema Elétrico Nacional (SEN) e o desequilíbrio entre províncias, que afetavam a maioria dos cubanos, exceto os habaneros, com apagões diários de duração muito maior.
A falta de gás liquefeito levou milhares de lares a usarem fogões elétricos, agravando ainda mais os picos de demanda quando a eletricidade retornava, segundo a versão oficial. A realidade é que milhares de famílias cubanas se viram obrigadas a recorrer ao carvão para cozinhar os alimentos devido à falta de luz elétrica e gás liquefeito.
Maio (segunda metade): O regime se contradiz antes de completar um mês
No dia 27 de maio, apenas seis dias após a promessa, o governo começou a suavizar seu discurso.
O diário oficialista Trabajadores publicou uma nota reconhecendo que os apagões continuariam durante os meses de julho e agosto, devido a um déficit estrutural que não poderia ser corrigido a tempo.
Lázaro Guerra Hernández, diretor de Eletricidade do MINEM, explicou que a disponibilidade estimada seria de apenas 1.935 MW em comparação a uma demanda potencial de 3.500 MW. O déficit ultrapassaria os 1.500 MW, tornando inevitável que os apagões fossem mais extensos do que o inicialmente anunciado.
Essa admissão antecipada deixou entrever que a promessa das “quatro horas diárias” era insustentável desde o início. Mesmo assim, durante semanas o discurso oficial continuou falando em “melhorias”, “estratégias graduais” e “trabalho intenso”.
Julio: O governo reconhece o fracasso
El 19 de julio, en sessão plenária da Assembleia Nacional do Poder Popular, o ministro de Energia e Minas, Vicente de la O Levy, confirmou publicamente o que já era evidente para milhões de cubanos: não foi cumprida a meta de reduzir os apagões no verão.
“Voltaremos aos níveis de afetação anteriores a a saída da termelétrica Antonio Guiteras”, declarou. A planta, recém-sincronizada ao SEN, havia gerado expectativas que logo se desvaneceu.
O ministro justificou o descumprimento pela escassez de combustíveis, os elevados custos internacionais e problemas técnicos acumulados. No entanto, não ofereceu datas concretas para uma possível recuperação nem assumiu qualquer responsabilidade pelas promessas não cumpridas.
Em junho, foram relatados apagões de até 20 horas diárias em alguns territórios. “Sei que ontem aqui muitas famílias enfrentaram mais de 20 horas sem luz... mas não nos rendemos”, disse no final daquele mês o governante Miguel Díaz-Canel durante uma visita aos municípios de Granma e Camagüey.
A mediados de julho, a média caiu para 11, sempre de acordo com cifras oficiais. Mas, na prática, os cortes múltiplos por dia, os apagões noturnos e a falta de planejamento visível continuavam afetando a qualidade de vida de milhões.
Agosto: Nenhuma solução estrutural à vista
Para o início de agosto, o panorama continuava sem mudanças significativas. Algumas usinas como Guiteras, Felton 1 ou Carlos Manuel de Céspedes (Cienfuegos) estavam operacionais, mas outras continuavam fora de serviço ou precisavam de manutenções urgentes.
A geração térmica continuava abaixo dos níveis exigidos, a geração distribuída ainda não alcançava seus objetivos, e os parques solares — embora em crescimento — não ofereciam estabilidade suficiente para sustentar o sistema.
Enquanto isso, o regime insistia em estratégias comunicativas que pediam “compreensão popular” e promoviam a economia, sem mencionar mecanismos de responsabilidade nem soluções de fundo.
A “estratégia gradual de recuperação” que o regime vinha anunciando desde agosto de 2022 desvanecia-se sem oferecer alívio real a uma crise que os especialistas consideram insuperável sem um importante desembolso de investimento público.
Onde está o dinheiro para resolver a crise? GAESA e os 18 bilhões nas sombras
Em meio a esta crise prolongada, cresce a indignação pública pelo uso dos recursos do país.
Diversas investigações jornalísticas e documentos vazados revelaram que o conglomerado militar GAESA —Grupo de Administração Empresarial S.A.— controla mais de 18 bilhões de dólares, recursos que não estão sendo investidos em infraestrutura energética nem no alívio da população.
With that money, it would be possible to build 12 modern combined-cycle plants of 500 MW each, which would more than cover the country's electricity demand. Alternatively, it could fund the purchase of enough fuel to ensure more than 15 years of generation at the current rate.
Con apenas uma fração desses fundos —cerca de 250 milhões anuais— seria possível estabilizar a rede elétrica e reduzir drasticamente os apagões, segundo afirmou o próprio comandante e vice-primeiro-ministro Ramiro Valdés Menéndez em outubro de 2021.
Mas o dinheiro está imobilizado ou destinado a outros fins. Em fevereiro de 2025, enquanto os cubanos suportavam longas quedas de energia diariamente, o regime inaugurou a Torre K23 em Havana, um hotel de luxo financiado pela GAESA que consome quase 2 MW de forma contínua. Seu custo, estimado entre 226 e 565 milhões de dólares, poderia ter financiado a reparação de várias usinas termoelétricas.
Economistas como Pavel Vidal têm denunciado que a GAESA opera como um banco central paralelo, que recebe orçamento estatal, mas não paga impostos, não presta contas e age à margem do controle civil. Em vez de investir em energia, saúde ou alimentação, seus fundos são destinados a megaprojets turísticos sem impacto real na vida do cidadão comum.
Um apagão político, não apenas elétrico
A linha temporal deixa claro: o regime fez uma promessa no dia 21 de maio, começou a retratar-se no dia 27 e reconheceu o fracasso no dia 19 de julho. Não se trata apenas de uma crise técnica, mas de um colapso estrutural agravado por decisões políticas que priorizam os interesses do aparelho militar e turístico em detrimento do bem-estar social.
Enquanto houver capital oculto sem controle nem redistribuição, os apagões não serão apenas um problema energético. Serão também o sintoma de uma política que apaga a esperança do povo cubano todos os dias.
Arquivado em:
