Donald Trump desencadeou uma nova tempestade política e midiática ao reincidir em um de seus comentários mais insultuosos contra os imigrantes.
Em um comício na Pensilvânia nesta terça-feira, o presidente dos Estados Unidos voltou a questionar abertamente por que seu país “somente aceita pessoas de países de merda”, provocando uma onda de reações pelo conteúdo xenófobo e racista de sua retórica.
“Por que só aceitamos pessoas de países ruins?”
Durante um discurso diante de seus seguidores, Trump não apenas repetiu um comentário que há anos negou ter feito, mas também o reivindicou com orgulho.
“Por que só aceitamos pessoas de países de merda? Por que não podemos trazer pessoas da Noruega, Suécia...? Apenas alguns, tragam alguns da Dinamarca”, disse diante de uma multidão que aplaudia entre risadas.
A frase não é nova, mas o tom desafiador com que a pronunciou é que é diferente, desta vez sem disfarces nem matizes.
O mandatário recordou a famosa reunião de 2018 com legisladores na Casa Branca, na qual meios como The Washington Post e The New York Times relataram que Trump havia utilizado esse mesmo termo para se referir ao Haiti, El Salvador e outras nações africanas.
Então ele negou publicamente. Agora, em 2025, ele repete e se vangloria.
“Sempre aceitamos pessoas da Somália”, continuou nesta terça-feira, referindo-se a esse país como “imundo, sujo, repugnante, repleto de crime”.
A polêmica pergunta gerou muita controvérsia nas redes.
"A resposta é evidente, os suecos e os noruegueses não vão a países de quinta... Graças a Trump, em menos de um ano, os EUA se tornaram um país de quinta", alegou um internauta no X.
"A resposta é simples e não é preciso ser muito inteligente: os noruegueses ou suecos não vão deixar seu país para ir para os seus Estados Unidos de merda!", acrescentou outro.
Uma visão supremacista da migração
As palavras do líder republicano estão alinhadas com sua visão de uma imigração "seletiva" ou "meritocrática", na qual somente deveriam ser admitidas pessoas provenientes de países que ele considera "desejáveis".
“Lugares repugnantes carregados de criminalidade” assim qualificou muitas das nações de onde vêm aqueles que buscam uma nova vida nos Estados Unidos.
A implicação é clara e remete a outra publicação que fez no Truth Social no Dia de Ação de Graças: os imigrantes provenientes de países pobres ou do chamado Terceiro Mundo não são bem-vindos.
Em seu comício, Trump anunciou com tom triunfal uma “pausa permanente na migração do Terceiro Mundo”, incluindo países como “Afeganistão, Haiti, Somália e muitos outros”.
Este enfoque tem sido amplamente criticado por organizações de direitos humanos, líderes internacionais e até mesmo membros do seu próprio partido no passado.
Já em 2018, o presidente do Senegal expressou sua "surpresa" diante de tais declarações, exigindo respeito para a África e a raça negra.
O retorno de um velho escândalo
Cabe lembrar que em janeiro de 2018, durante a discussão sobre a reforma migratória, Trump disse: “Por que temos toda essa gente desses países de merda chegando aqui?”, referindo-se ao Haiti, El Salvador e nações africanas.
Ao mesmo tempo, defendia a recepção de imigrantes de “países como a Noruega”.
Embora na ocasião tenha negado nas redes sociais, afirmando que era uma "invenção dos democratas", a Casa Branca não desmentiu os comentários. Na verdade, o então porta-voz Raj Shah defendeu que o presidente buscava um sistema migratório baseado no mérito, como outros países desenvolvidos.
Na mesma reunião, de acordo com o The New York Times, Trump teria dito que os haitianos "têm AIDS" e que os nigerianos não voltariam "para suas cabanas" se vissem os Estados Unidos. A Casa Branca negou então essas afirmações.
A animadversão de Trump em relação à Europa
Mas Trump não atacou apenas os imigrantes do Sul Global nesta terça-feira. Ele também criticou a Europa e suas políticas migratórias.
“Europa é um grupo de países em decadência, liderados por líderes fracos”, disparou, retomando um discurso de desconfiança em relação aos aliados tradicionais dos Estados Unidos.
Advertiu até que as decisões de Bruxelas em matéria de imigração “serão seu fim”, distanciando-se de um continente que em outras épocas foi considerado um parceiro estratégico.
O republicano insistiu novamente que o separa mais da Europa do que o une.
Este tipo de declarações não são novas na retórica trumpista.
Desde seu primeiro mandato, o presidente americano tem construído uma visão isolacionista do mundo, na qual os Estados Unidos se erguem como uma potência autosuficiente, desvinculada de compromissos multilaterais ou alianças históricas.
Política exterior no estilo "showman"
Em uma tentativa de demonstrar liderança internacional, Trump também fez referência à escalada militar entre a Tailândia e o Camboja. Garantiu que irá ligar pessoalmente para os líderes de ambos os países “para impedir uma guerra entre duas nações muito poderosas”.
"Lamento dizer isso [...] Camboja e Tailândia começaram hoje (novos confrontos) e amanhã terei que fazer uma ligação", disse, provocando aplausos do público.
“Quem mais pode dizer que fará uma chamada e interromperá uma guerra?”, perguntou a seus seguidores em tom retórico.
O conflito entre a Tailândia e o Camboja, que reacendeu uma disputa territorial histórica, foi qualificado por Trump como um dos oito conflitos que "terminaram" desde seu retorno ao poder em janeiro.
Entre a provocação e a estratégia
As saídas de tom do presidente não são fruto do acaso. Elas fazem parte de uma estratégia comunicativa que o manteve no centro do debate político americano desde sua entrada na campanha presidencial de 2015.
Seu estilo provocador, que rompe deliberadamente com as normas do decoro político, lhe rendeu tanto a devoção de uma base ultraconservadora quanto a condenação de seus críticos.
Em datas recentes, voltou a usar palavrões em público e a empregar termos denigrantes. Durante o Dia de Ação de Graças, chamou um governador democrata com um insulto depreciativo em relação a pessoas com deficiência intelectual.
Questionado por um jornalista se mantinha suas palavras, sua resposta foi: “Sim. Acredito que algo ruim está acontecendo com ele.”
As novas declarações de Trump reabrem um profundo debate sobre o racismo institucional. Suas palavras não apenas insultam milhões de pessoas ao redor do mundo, mas também reforçam estigmas perigosos que alimentam a discriminação e o ódio.
A ideia de que alguns países - e, portanto, seus cidadãos - são intrinsecamente melhores que outros constitui a própria base do supremacismo racial.
A reincidência nesses comentários, longe de ser um deslize, confirma que fazem parte estrutural de seu discurso político.
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