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O governo cubano publicou o projeto de lei que busca, de maneira excepcional, reduzir o mandato dos delegados municipais e ajustar o calendário eleitoral do país. A proposta chega em um momento de acentuada tensão social e econômica, quando a cidadania reivindica maior transparência e participação, e quando a legitimidade das estruturas locais do Poder Popular atravessa um de seus momentos mais frágeis.
O projeto, divulgado pela Assembleia Nacional do Poder Popular e assinado por seu presidente, Juan Esteban Lazo Hernández, estabelece que o atual mandato dos delegados municipais não será de cinco anos, como determina a Constituição, mas de quatro, culminando em novembro de 2026, cuja aprovação pela Assembleia Nacional é praticamente um fato, dado o caráter formal desses processos legislativos em Cuba.
A Assembleia argumenta que este corte é necessário para “restabelecer a sequência eleitoral” entre a eleição de delegados municipais e a de deputados nacionais, que ficou desfasada após a pandemia de COVID-19.
Em seu site, o Parlamento insiste que a publicação do documento tem o objetivo de promover a participação cidadã, convidando os cubanos a enviar opiniões por e-mail. É um gesto pouco comum na dinâmica legislativa oficial, onde os processos costumam chegar ao plenário com escasso intercâmbio público real. Mesmo assim, para muitos cubanos, a questão chave não é técnica, mas política: por que a necessidade urgente de mover o calendário eleitoral agora?
A divulgação do projeto ocorre apenas dias depois de que, no dia 26 de novembro, a Assembleia convocasse seu Sexto Período Ordinário de Sessões, previsto para o dia 18 de dezembro.
Nessa sessão, serão avaliadas as medidas econômicas do Governo, o orçamento do Estado para 2026 e vários relatórios de prestação de contas, entre eles o do Governo Provincial de Ciego de Ávila. Também serão analisados diversos projetos de lei, incluindo aquele que altera o mandato dos delegados.
A coincidência temporal não passa despercebida. Enquanto amplos setores do país enfrentam apagões, escassez de alimentos, inflação e um crescente deterioro dos serviços, o Governo concentra parte de sua atenção na reorganização do calendário político, um processo que muitos percebem como distante das urgências cotidianas.
Para aqueles que vivem dentro da ilha, o anúncio não apenas gera inquietações, mas também ceticismo. As estruturas municipais do Poder Popular, incluindo os delegados de circunscrição, carregam um profundo descrédito, após anos demonstrando uma capacidade quase nula para resolver os problemas cotidianos da população.
Em muitos bairros, esses delegados deixaram de ser vistos como representantes efetivos e são percebidos mais como figuras simbólicas sem ferramentas reais, incapazes de responder a queixas sobre buracos, deslizamentos, insalubridade, transporte colapsado ou apagões intermináveis.
Nesse contexto, modificar o tempo de seus mandatos sem transformar um sistema que não funciona apenas reforça a sensação de distância entre as autoridades e uma cidadania cansada de que nada mude, por mais que o calendário político se mova.
O Parlamento assegura que a proposta já foi debatida em consultas anteriores e que será discutida novamente em dezembro.
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