Uma recente filtragem de documentos internos do conglomerado militar GAESA (Grupo de Administração Empresarial das Forças Armadas) revelou em detalhes a rede empresarial controlada pelos militares cubanos, que abrange setores estratégicos como o turismo, o comércio, a construção, o transporte, a banca e os serviços imobiliários, entre outros.
A investigação, publicada pela jornalista Nora Gámez em El Nuevo Herald, expõe como a GAESA atua como uma estrutura econômica paralela ao Estado, com dezenas de empresas organizadas sob diferentes formas legais - desde empresas estatais até associações econômicas internacionais e mipymes -, muitas das quais operam fora do radar público e sem transparência.
Um emaranhado empresarial opaco e centralizado nos militares
Segundo os documentos obtidos pelo jornal, entre eles estados financeiros internos e apresentações corporativas, GAESA mantém uma rede empresarial altamente diversificada, que opera de forma discreta dentro e fora de Cuba.
Em conjunto, essas empresas permitem aos militares controlar desde o turismo e as remessas até a importação de alimentos e a venda de petróleo.
O conglomerado inclui empresas estatais tradicionais, mas também entidades registradas em paraísos fiscais e novas mipymes, que legalmente podem parecer privadas, mas estão sob controle direto ou indireto do aparato militar.
Embora algumas dessas empresas fossem conhecidas publicamente, muitas não haviam sido identificadas anteriormente como parte da GAESA até a publicação dos documentos vazados.
Três tipos de empresas sob a GAESA
Os documentos classificam as entidades em três grupos: associações econômicas internacionais, empresas estatais e mipymes. A seguir, apresentamos a lista com as empresas mencionadas:
1. Associações Econômicas Internacionais
Estas entidades operam sob acordos com parceiros estrangeiros, em modalidades mistas ou através de contratos de serviços:
Monte Barreto: Empresa imobiliária proprietária do complexo Miramar Trade Center em Havana, em sociedade com a Ceiba Investments Ltd., registrada na Ilha de Guernsey.
Azul Inmobiliaria: Administra condomínios em parceria com a empresa italiana BD International.
Logística Hotelera del Caribe (LHC): Com sede na Zona Especial de Desenvolvimento do Mariel, abastece hotéis em Cuba com alimentos e suprimentos.
2. Empresas estatais controladas pela GAESA
Estas são entidades tradicionais do setor público que operam diretamente sob a estrutura militar:
-Complexo de Museus Históricos Militares: gere locais como o Museu da Revolução e as fortalezas de El Morro e La Cabaña.
- Comercializadora de Aceite Ecasol: especializada na venda de óleo de cozinha.
- Empresa de Serviços Gerais da Marinha: não foram encontrados dados públicos disponíveis.
Direção Integrada de Projetos Mariel: administra projetos de infraestrutura no Mariel.
- Empresa Inmobiliária Almest: realiza investimentos hoteleiros.
- Empresa TRD-Caribe: uma das principais redes de lojas em moeda livremente conversível (MLC).
-Aerogaviota S.A.: companhia aérea focada no turismo nacional e internacional.
- Almacenes Universales S.A.: realiza operações logísticas, especialmente no porto do Mariel.
- Corporación Antex S.A.: contrata médicos e gerencia negócios em Angola.
-Cubagro S.A.: importadora/exportadora de produtos agropecuários.
-Exploração e Extração de Petróleo e Gás S.A.: possivelmente vinculada à antiga CUPET.
Grupo de Turismo Gaviota S.A.: principal empresa turística do país, epicentro do setor hoteleiro em divisas.
Inmobiliaria Caribe S.A.: oferece aluguéis em áreas privilegiadas de Havana.
-Servicios Marítimos S.A.: sua atividade está relacionada a operações portuárias em Mariel.
-Servicios Automotores S.A.: comercializa automóveis e peças.
-Servicios de Auditoría S.A.: com sede em Miramar, Havana.
-Áries S.A.: opera a terminal de cruzeiros do porto de Havana.
Tecnoimport: empresa importadora com histórico de demandas internacionais.
-Cementos Moncada: nova planta de cimento em Santiago de Cuba, anunciada como projeto de investimento em 2021.
3. Mipymes vinculadas à GAESA
Embora o governo cubano promova as mipymes como parte de uma "abertura econômica", esses documentos revelam que algumas operam sob a tutela da TRD Caribe, o que implica sua vinculação direta com a GAESA:
-Agencia Importadora Caribe Surl (TRD).
- Publicitária Grafo Caribe Surl (TRD).
Ambas estão registradas como mipymes, mas fazem parte do ecossistema de empresas comerciais vinculadas às lojas em MLC.
O caso CIMEX: Poder comercial nas mãos militares
Um dos nomes que mais se destaca nos documentos é CIMEX, o maior holding do conglomerado militar.
Esta corporação controla negócios em áreas chave da economia: lojas, bancos, postos de gasolina, empresas logísticas, cafeterias, imobiliárias e até tecnológicas.
Em 2020, a CIMEX operava 668 postos de gasolina em todo o país e era composta por 41 empresas, segundo um relatório interno citado pelo El Nuevo Herald.
Entre as empresas que estão dentro da Cimex, encontram-se:
-Cimex Mariel: produtora de café Cubita e Caracolillo.
-Fincimex: gerencia remessas e cartões internacionais.
-Inmobiliaria Cimex S.A.
-Zelcom S.A.: zona franca próxima a Havana.
-Residencial Tarará S.A.: dedicada ao aluguel de propriedades.
-Aster S.A.: empresa de tecnologia com presença nas redes sociais.
Além disso, a diretora jurídica da Cimex, Mali Suris Valmaña, revelou em uma declaração judicial que a Cimex pertence à Corporación CIMEX, S.A., registrada no Panamá, o que confirma o uso de estruturas offshore para gerenciar ativos estatais fora do escrutínio nacional e internacional.
Empresas sancionadas… e outras que ainda não
GAESA e várias de suas empresas - como Cimex, Fincimex e Gaviota - estão sancionadas pelo governo dos Estados Unidos devido ao seu vínculo com as Forças Armadas e seu papel na repressão do povo cubano.
No entanto, outras empresas mencionadas nos documentos ainda não estão sancionadas, o que poderia permitir que continuassem operando com relativa liberdade no exterior ou por meio de intermediários.
A filtragem desses documentos confirma que a economia cubana está profundamente militarizada, com dezenas de empresas-chave sob o controle direto do Ministério das Forças Armadas Revolucionárias, por meio da GAESA.
Desde hotéis até postos de gasolina, passando por imobiliárias, companhias aéreas, serviços financeiros e exportações, os militares estão à frente da maior parte do aparato produtivo em Cuba.
Este modelo de controle centralizado e opaco permitiu que um pequeno grupo concentrasse poder econômico e político, enquanto a maioria da população enfrenta uma das piores crises humanitárias em décadas.
A existência de mipymes "privadas" dentro do arranjo militar e a operação de empresas em paraísos fiscais são evidências de um sistema projetado para garantir o controle econômico do regime, mesmo em meio a sanções e colapso interno.
A investigação do Herald, baseada em 22 documentos financeiros internos vazados de 2023 e 2024, revelou também que o exército cubano controla mais de 18 bilhões de dólares em ativos líquidos, o que representa mais do que as reservas internacionais de países como Panamá ou Uruguai.
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