De matadouro a guarapera: combinado cárnico de Niquero sobrevive vendendo raspadura e fatias de manga

O combinado cárnico Inocencio Bladwood no município granmense de Niquero está se reinventando ao produzir doces devido à falta de gado e combustível, refletindo a crise industrial de Cuba. A pecuária enfrenta um declínio crítico.

Um retrato fiel da debacle industrial em CubaFoto © La Demajagua/Agustín Rodríguez Sam

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Com a drástica queda no suprimento de gado, porcos e combustível, o antigo combinado cárnico Inocencio Bladwood de Niquero, na província de Granma, sobrevive produzindo doces e guarapo em vez de carne, em um retrato cru da precariedade industrial em Cuba.

A falta de animais para sacrificar e diesel para operar, a planta pertencente à Empresa Cárnica provincial trocou embutidos por fatias de manga, raspadura e guarapo de cana, informou o jornal oficial La Demajagua.

De acordo com Alexis la Hera Segura, diretor da entidade, nos últimos dois anos conseguiu processar pouco mais de 140 toneladas de embutidos, cozidos com lenha devido à escassez de combustível.

Durante esse mesmo período, foram produzidas 1,3 toneladas de alimentos elaborados, assim como guarapo de cana, raspadura e fatias de manga, com destino à população do município de Niquero; enquanto a jamonada, mortadela e butifarra são comercializadas para o setor de Educação - para o lanche escolar -, outros organismos e o povo, segundo a fonte.

A reconversão forçada é apresentada na imprensa estatal como um exemplo de criatividade e esforço. A Hera garantiu que a diversificação permitiu manter a entidade em funcionamento e assegurar salários mensais que chegam até 13.000 pesos.

A transformação do combinado incluiu mudanças laborais. Yordanis Torres Capote, antigo técnico em processamento, assumiu o cargo de horneiro, uma função que não existia antes na planta. Mas o que subjaz é um deslocamento forçado de funções diante do colapso do abastecimento básico.

Longe de refletir um avanço ou modernização, a nova face do matadouro simboliza o retrocesso produtivo do país. A indústria alimentícia, atingida pela falta de insumos, transporte e eletricidade, se reinventa não por vontade, mas por necessidade.

O que antes era um centro de processamento de carne hoje se mantém ativo graças a produtos marginais, cuja elaboração é mais um símbolo de resistência do que de desenvolvimento.

O “Inocencio Bladwood”, agora convertido em um centro integral de produção de alimentos, foi distinguido com a bandeira de Proeza Laboral e apresentado como um dos pilares do município em relação às celebrações do 26 de julho. Porém, por trás da narrativa oficial queda uma verdade menos gloriosa: quando um matadouro acaba fazendo doces, não há vitória, mas sim uma alarmante adaptação ao vazio.

A ganadería cubana atravessa uma crise severa, com a perda acumulada de mais de 900.000 cabeças de gado desde 2019, segundo dados oficiais apresentados recentemente pelo Ministério da Agricultura (MINAG).

Ao apresentar os números diante de uma das comissões do parlamento, o diretor geral de Pecuária, Arián Gutiérrez Velázquez, informou que ao final de 2024 a massa pecuária no país era de apenas três milhões de animais, o que representa uma diminuição de cerca de 400.000 cabeças em relação ao ano anterior, informou o jornal oficial Granma.

A tendência de queda não se deve apenas a fatores naturais como a mortalidade, mas também a problemas estruturais graves, como o furto e sacrifício ilegal, que apenas no último ano afetou mais de 27.000 animais, entre bovinos e equinos.

Além disso, reconheceu-se que a situação também é resultado de descumprimentos e negligências por parte dos inquilinos e das entidades estatais.

Outros fatores relacionados com a acentuada diminuição do número de gado incluem falhas nas tecnologias de criação, déficit de insumos veterinários e alimentares, deterioração produtiva, furtos e sacrifícios ilegais.

A isso se somam a falta de alimentos e forragem, o déficit de insumos veterinários, o deterioramento da infraestrutura produtiva e a ausência de incentivos econômicos para os produtores, que têm afetado gravemente a criação e reprodução do gado.

A imprensa oficial revelou recentemente que o colapso da pecuária no município tunero de Jobabo é resultado de anos de improvisação, falta de investimento e estratégias esquecidas. O que antes era um sistema com potencial produtivo, hoje sobrevive com um terço dos níveis de coleta de leite que existiam antes de 2020.

Campesinos cubanos denunciaram que o roubo e sacrifício de gado continuam fora de controle nos campos da ilha, em meio à crise econômica e à escassez de alimentos, o que afeta gravemente a economia agropecuária e a segurança alimentar.

Por sua vez, a província de Camagüey, que durante anos foi a maior produtora de leite em Cuba, viu seu volume anual desmoronar para menos da metade dos 92 milhões de litros que produziu em 2019, um retrocesso não apenas numérico, mas que reflete uma crise estrutural onde imperam a desordem, os pagamentos em atraso e a falta de respostas efetivas.

Uma fiscalização nacional realizada entre março de 2024 e janeiro de 2025 detectou 181.854 irregularidades no controle do rebanho bovino em Cuba, conforme informou Yudith Almeida Núñez, chefe do Departamento de Registro Pecuário do MINAG.

Diante deste panorama, o referido ministério propõe priorizar os tenentes com mais de 10 vacas, ampliar a concessão de terras a produtores com bons resultados, desenvolver o mercado de insumos e fomentar a exportação de carvão vegetal como incentivo econômico.

Da mesma forma, falaram sobre resolver o problema do abastecimento de água por meio de fontes de energia renovável, enfrentar o uso ineficiente de terras ociosas infestadas de marabú e acelerar a informatização dos registros pecuários.

Também se discutiu a necessidade de organizar as cadeias de valor e suprimentos, assim como promover encadeamentos produtivos com a indústria nacional e territorial para aumentar a produção de leite e carne.

Perguntas frequentes sobre a crise industrial e alimentar em Cuba

Por que a indústria de carne Inocencio Bladwood em Niquero mudou sua produção de carne para doces e guarapo?

O combinado de carnes Inocencio Bladwood em Niquero mudou sua produção de carne para doces e guarapo devido à escassez de bois, porcos e combustíveis. Diante da falta de animais para abate e da carência de diesel para operar, a planta foi obrigada a diversificar sua produção para sobreviver, fabricando fatias de manga, raspadura e guarapo de cana.

Qual é a situação atual da pecuária em Cuba?

A pecuária em Cuba enfrenta uma grave crise, com uma perda acumulada de mais de 900.000 cabeças de gado desde 2019. O rebanho do país foi reduzido a três milhões de animais ao final de 2024, devido a problemas estruturais sérios como furto, abates ilegais, falta de insumos veterinários e alimentos, e deterioração da infraestrutura produtiva.

Como a crise energética afetou a produção de alimentos em Cuba?

A crise energética afetou gravemente a produção de alimentos em Cuba, limitando a capacidade das indústrias de operar adequadamente. A falta de eletricidade e combustível levou a setores como a pesca e a produção de açúcar a serem severamente prejudicados, obrigando a recorrer a métodos de produção rudimentares, como a conservação de peixe em sal e sol ou a cocção com lenha.

Quais medidas estão sendo tomadas em Cuba para enfrentar a escassez de alimentos?

Em Cuba, estão sendo tomadas medidas como a diversificação de produtos e o uso de técnicas ancestrais para enfrentar a escassez de alimentos. Isso inclui a produção de doces e guarapo, a conservação de peixe em salmoura, e a mistura de farinha de trigo com extensores como batata-doce, mandioca e abóbora para estender a matéria-prima disponível. Essas medidas refletem mais uma resposta à precariedade do que um avanço produtivo.

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