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O regime cubano considerou que Cuba “não era nem é uma prioridade para Trump”, apesar de anos de insistência sobre o efeito prejudicial e a aversão do mandatário americano em relação à chamada “revolução cubana”.
Contrária ao mantra oficial que se repetiu até a exaustão de que a crise atual é consequência do “agravamento do bloqueio” e das “mais de 240 medidas” tomadas por Donald Trump em seu primeiro mandato, a subdiretora geral da Direção dos Estados Unidos do Ministério das Relações Exteriores de Cuba (MINREX), Johana Tablada de la Torre, afirmou que Cuba não está entre as prioridades do republicano em seu retorno à Casa Branca.
Em uma publicação em suas redes sociais, que foi replicada pelo site oficialista Cubadebate, a alta funcionária criticou os cubano-americanos que estão na linha de frente da atual administração Trump, a quem atribuiu um interesse febril em promover medidas de pressão contra Havana.
“Menos a ruptura das relações diplomáticas e o bloqueio naval a Cuba, que propuseram mil vezes, quase tudo o mais conseguiram tirar do governo Trump, para quem Cuba não era nem é uma prioridade, mas deseja agradar aos políticos de origem cubana que melhor lhe servem, embora o tenham enganado uma e outra vez”, afirmou a diplomática.
A declaração representa uma mudança notável na narrativa oficial do regime cubano que tradicionalmente tem sustentado que Washington mantém uma "obsessão doentia" por destruir a “revolução cubana”, acusando-o de implementar políticas destinadas a asfixiar economicamente o país.
No entanto, em seu artigo intitulado "Claver-Carone e sua obsessão por Cuba", Tablada de la Torre deu uma reviravolta notável em sua narrativa habitual e desviou o foco do republicano, para denunciar que suas medidas são frutos da influência desses atores e não de um verdadeiro interesse de Trump pelas relações com a ilha.
Desentende-se a diplomática de duas questões fundamentais. A primeira, a proximidade de Trump com a comunidade cubano-americana e os políticos da Flórida, estado onde o presidente passa boa parte do ano. A percepção de Cuba como uma ditadura prejudicial aos interesses dos Estados Unidos na região chega a Trump principalmente por essa via.
A segunda, e não menos importante, está relacionada com a psicologia do atual presidente, para quem é difícil deixar-se guiar ou manipular por assessores e mantém sempre o protagonismo nas decisões que toma, o que, no caso de Cuba, mostra que as medidas que adotou em seu primeiro mandato, assim como as que anunciou para o segundo, têm origem em sua visão das relações dos Estados Unidos com o regime comunista.
A afirmação de que “Cuba não era nem é uma prioridade para Trump” parece não se sustentar nos fatos, mas representa, sim, uma mudança discursiva significativa na retórica tradicional do regime, que sempre tem centrado suas denúncias do “bloqueio” e outras “políticas agressivas” na figura dos ocupantes da Casa Branca.
Durante a primeira administração Trump (2017-2021), foram implementadas mais de 240 medidas que reforçaram o embargo econômico contra Cuba, incluindo a reincorporação da ilha na lista de Estados patrocinadores do terrorismo em janeiro de 2021. Essa abordagem foi mantida pela administração Biden, exceto no último ponto, que foi modificado dias antes de o democrata deixar a presidência.
Em janeiro de 2021, o próprio site Cubadebate se referia a “as mais de 240 medidas de Trump contra Cuba”, sublinhando que “a política de hostilidade do governo de Donald Trump contra Cuba registrou medidas e ações sem precedentes, as quais se destacaram pela sua sistematicidade”.
Nas mais de 6.000 palavras do artigo publicado pelo site oficialista e redigido no MINREX, não foi mencionado uma única vez o nome de senadores ou congressistas cubano-americanos, ou o de Mauricio Claver-Carone, que agora Havana aponta como o Maquiavel que sussurra ao ouvido de Trump.
Nesse sentido, chama a atenção que Tablada de la Torre afirme que "Cuba não era nem é uma prioridade para Trump". O contexto geopolítico atual, com a guerra provocada pela invasão da Rússia à Ucrânia, ou a polêmica busca por soluções para a Faixa de Gaza, parecem absorver toda a atenção midiática, o que poderia conferir certo verniz de análise às conclusões da diplomata do regime cubano.
No entanto, a evidência empírica demonstra que o republicano imprime sua assinatura em cada decisão que toma, como se fosse uma questão pessoal, e que, além da influência do círculo de assessores e funcionários cubano-americanos de sua administração, Trump parece decidido a restabelecer a área de influência americana na região, um objetivo que evidentemente passa por Havana.
Seja no Palácio ou no MINREX, os nervos estão à flor da pele. Mas as instruções são para direcionar os ataques ao grupo “mafioso” de cubano-americanos e que as declarações mal toquem na pétala de uma rosa ao magnata republicano, com o qual Havana começa a ter sonhos molhados atravessados de pesadelos e sobressaltos, após a reviravolta nas relações dos Estados Unidos com a Rússia.
Na era caótica e imprevisível inaugurada por Trump, o regime cubano cruza os dedos para que ocorra o primeiro conflito do presidente com seus subordinados – um comportamento que marcou seu primeiro mandato – e que os "falcões" cubano-americanos saiam de cena.
Enquanto isso, começam a tornar a situação mais palatável para o republicano, na esperança de que em um cenário mais favorável possam promover uma aproximação e uma negociação que termine com o mesmo resultado dos últimos 66 anos: com a ditadura consolidada no poder.
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