A comparecência desta segunda-feira da ministra do Trabalho e Segurança Social, Marta Elena Feitó Cabrera, perante uma comissão do Parlamento, onde afirmou, sem escrúpulos nem remorsos, que em Cuba não há mendicância, mas sim “pessoas disfarçadas de mendigos”, recebeu uma resposta contundente do economista Pedro Monreal: “Deve ser que também há gente disfarçada de ‘ministra’”.
Em seu turno ao microfone diante dos membros do órgão legislativo cubano, Feitó negou com um cinismo absoluto a existência de mendigos no país e criminalizou sem rodeios as pessoas que buscam comida no lixo, pedem esmola ou dormem nas ruas, pronunciamentos que desencadearam reações furiosas e críticas severas de cubanos nas redes sociais.

Uma das vozes que, nas últimas horas, se manifestaram para refutar os equívocos da titular cubana foi a de Monreal, um analista e crítico sistemático das políticas e decisões da cúpula governante da ilha, que qualificou de reacionárias as palavras de Feitó.
"La 'ministra' dos salários e pensões de miséria fez o discurso mais insolentemente reacionário da 'continuidade'", afirmou o economista.
"Diz que em Cuba não há mendigos, mas sim pessoas disfarçadas de mendigos. Deve ser que também há gente disfarçada de 'ministra'", ironizou em um comentário na rede social X, onde desafiou a alta funcionária do regime que, com mão firme, comanda os assuntos trabalhistas e os programas de assistência social no país.
Parece que a ‘ministra’ não lhe importam os pobres, mas sim a sua aparência. Ela os chama de bêbados, simuladores e ilegais”, destacou Monreal.
“Senhora, o combate é contra a pobreza, não contra os pobres”, avisou-lhe, ao mesmo tempo que a instou a “parar com essas divagações e propor salários e pensões decentes”, tendo em vista o limitado poder aquisitivo dos trabalhadores e aposentados cubanos diante da inflação galopante e da grave crise econômica em Cuba.
Feitó se atreveu a dizer nesta segunda-feira diante da Assembleia Nacional que aqueles que vivem nas ruas do país fingem ser mendigos, mas não são. “Temos visto pessoas aparentemente mendigos; quando você olha para as mãos, quando você observa as roupas que essas pessoas vestem, elas estão fantasiadas de mendigos. Não são mendigos, em Cuba não há mendigos”, afirmou, e os acusou de encontrar “um modo de vida fácil para ganhar dinheiro e não trabalhar com as formalidades que correspondem”.
A dirigente chamou os cidadãos que o regime classifica como "deambulantes" de bêbados e buscadores de "uma vida fácil", sem se referir às causas estruturais do fenômeno nem admitir a ineficácia das medidas promovidas pelo ministério que lidera para erradicá-lo.
Diante do grave problema que se agravou nos últimos anos em proporção direta com o aprofundamento da crise econômica, Feitó se permitiu minimizar e desvirtuar o contexto do fenômeno social: “Normalmente, chamamos de conduta deambulante a qualquer coisa. Por exemplo, quando há uma pessoa na rua limpando para-brisas (…), isso não é um deambulante, é uma pessoa que buscou um modo de vida fácil, em um semáforo limpando para-brisas, e possivelmente, com esse dinheiro, o que ela faz é ir beber bebidas alcoólicas na esquina.”
Em seu afã negacionista de uma realidade que é evidente para qualquer um que transite pelas ruas cubanas, a funcionária não hesitou em zombar das pessoas que procuram alimentos nos contêineres de lixo.
“Os mergulhadores estão na água. Estas pessoas que estão nos contêineres de lixo, jogando o lixo no chão, revirando o lixo, procurando latas... essas pessoas, como alguns dizem: ‘não, estão procurando comida nos latões de lixo’, isso também não é verdade. Esses são padrões que tentam nos impor, que não são verdadeiros”, afirmou.
A seguir, atacou “essas pessoas que estão recuperando matéria-prima” e as acusou de “ilegais do trabalho por conta própria (…) que estão violando o fisco porque estão exercendo uma atividade econômica pela qual não estão obtendo receita alguma”.
Feitó intensificou seu discurso retórico contra as pessoas vulneráveis que vivem nas ruas, como se estivesse enfrentando um exército inimigo: “Precisamos chamar as coisas pelo seu nome e precisamos combater todas essas condutas negativas”.
O relatório da ministra contrasta com a realidade do país, onde 89 % das famílias sofrem pobreza extrema, segundo dados do Observatório Cubano de Direitos Humanos (OCDH).
Incluso, suas palavras nesta segunda-feira entram em contradição com declarações anteriores. Em fevereiro passado, na presença do mandatário Miguel Díaz-Canel, Feitó reconheceu que em Cuba existiam, até então, 1.236 comunidades que vivem na miséria.
Além disso, afirmou que 96% dos problemas relacionados a essa extrema pobreza no país estavam “em processo de transformação integral”, justo quando Cuba atravessa uma das piores crises econômicas de sua história.
Perguntas frequentes sobre a negação da mendicidade em Cuba e as reações públicas
O que afirmou a ministra do Trabalho e da Segurança Social de Cuba sobre a mendicância?
A ministra do Trabalho e da Segurança Social de Cuba, Marta Elena Feitó Cabrera, afirmou que em Cuba não há mendigos, mas sim pessoas disfarçadas de mendigos, sugerindo que essas pessoas encontraram uma forma fácil de ganhar dinheiro sem trabalhar formalmente. Este comentário recebeu críticas por sua falta de empatia diante da evidente pobreza no país.
Como o economista Pedro Monreal respondeu às declarações da ministra?
Pedro Monreal, um economista e crítico das políticas do governo cubano, respondeu com ironia dizendo que deve ser que também há gente disfarçada de 'ministra', criticando assim o discurso negacionista de Feitó. Monreal enfatizou que o verdadeiro combate deveria ser contra a pobreza, não contra os pobres.
Qual tem sido a reação da sociedade civil e de outros críticos às declarações da ministra?
As declarações da ministra provocaram uma onda de indignação nas redes sociais e entre figuras públicas. A locutora Laritza Camacho e o economista Pedro Monreal, entre outros, criticaram a falta de sensibilidade do discurso e a negação da realidade da pobreza extrema em Cuba.
Quais contradições existem no discurso oficial sobre a pobreza em Cuba?
Apesar das declarações da ministra, relatórios anteriores reconheceram a existência de comunidades em miséria e 89% das famílias em pobreza extrema. A negação da pobreza por parte da ministra contrasta com dados de organismos como o Observatório Cubano de Direitos Humanos, o que indica uma contradição no discurso oficial.
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