Entre a escassez e a humilhação: Lieter Ledesma afirma que “todos mendigamos em Cuba”

O artista retratou sem eufemismos o que, para milhões de cubanos, se tornou uma condição cotidiana e sistêmica: a humilhação constante de ter que pedir - ao Estado, aos amigos no exterior, a qualquer porta que se abra - o mais elemental para viver.

Lieter LedesmaFoto © CiberCuba e Facebook/Lieter Ledesma

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“Nos ensinaram a mendigar, escondidos na palavra 'resolver'. Fomos obrigados. Eu fiz, eu mendiguei”, denunciou o ator e escritor cubano Lieter Ledesma, em um post cru e emotivo nas redes sociais que deu rosto e voz ao profundo mal-estar coletivo que explodiu após as recentes declarações da ministra do Trabalho e Segurança Social, Marta Elena Feitó Cabrera.

Ledesma, radicado nos Estados Unidos, retratou sem eufemismos o que, para milhões de cubanos, se tornou uma condição cotidiana e sistêmica: a humilhação constante de ter que pedir —ao Estado, aos amigos no exterior, a qualquer porta que se abra— o mais elementar para viver.

Publicação no Facebook/Lieter Ledesma

“Mendiga o desgobierno, mendigam osFuncionários, os desportistas, os artistas. Mendiga um povo inteiro ao amigo estrangeiro: uma recarga, medicamentos, comida… a vida”, escreveu.

Palavras que acenderam a indignação

O estalo social digital surgiu como uma resposta direta às polêmicas palavras da ministra Feitó, que durante uma sessão parlamentar afirmou que em Cuba “não há mendigos” e que aqueles que dormem em portais ou pedem esmola “estão disfarçados”:

“Encontraram uma maneira fácil de ganhar dinheiro sem trabalhar”, disse, em uma frase que foi considerada insensível, arrogante e distante da realidade.

A reação nas redes foi imediata. Artistas como Luis Alberto García, Ulises Toirac e Rigoberto Ferrera, assim como intelectuais, jornalistas e cidadãos comuns, condenaram o discurso por negar a existência da pobreza extrema na ilha.

Repreensão presidencial

Ante a crescente pressão, Miguel Díaz-Canel interveio para se distanciar da ministra durante uma intervenção perante a Comissão de Atendimento à Juventude, Infância e Direitos de Igualdade da Mulher do Parlamento. Sem nomeá-la, reconheceu que: “A existência de pessoas em situação de rua é um fenômeno real e indesejado em nossa sociedade”, e acrescentou: “Não compartilho alguns critérios emitidos na comissão sobre este tema. É contraproducente emitir julgamentos como esses.”

Também o primeiro-ministro Manuel Marrero Cruz reagiu, apelando para a empatia, embora sem condenar abertamente Feitó. Reiterou que a atenção aos mais vulneráveis “é prioridade” do governo e advertiu que “a sensibilidade não pode ser discurso, deve ser ação”.

E o Ministério?

Apesar da tempestade midiática, o Ministério do Trabalho e da Segurança Social (MTSS) mantém um silêncio desconfortável. Seus canais oficiais continuam promovendo temas como o pluriemprego ou o novo Código de Trabalho, sem uma única palavra sobre as declarações que provocaram uma indignação generalizada.

"Mendigar não deveria ser um destino."

A publicação de Lieter Ledesma conseguiu o que raramente se alcança: desnudar a verdade sem filtros. Não com números, mas com vivências. Com dor compartilhada.

“O cubano anseia por um país diferente. Que esse sonho deixe de ser uma quimera. Não devemos mendigar por aquilo que nos pertence por direito”, concluiu.

Em uma ilha onde a escassez se tornou rotina e a dignidade um luxo, a mendicância não se esconde: se normaliza. E isso, como lembrou Ledesma, é talvez a ferida mais profunda.

Perguntas frequentes sobre a situação da mendicidade em Cuba

O que afirmou a ministra do Trabalho de Cuba sobre a mendicidade?

A ministra do Trabalho e da Segurança Social de Cuba, Marta Elena Feitó Cabrera, afirmou que em Cuba não há mendigos, mas sim pessoas disfarçadas de mendigos, sugerindo que encontraram um modo de vida fácil para ganhar dinheiro sem trabalhar formalmente. Esta declaração foi amplamente criticada por sua insensibilidade e desconexão com a realidade social do país.

Como reagiram os cubanos às declarações da ministra sobre os mendigos?

A reação foi imediata e contundente. Intelectuais, artistas, jornalistas e cidadãos comuns expressaram sua indignação nas redes sociais, qualificando as palavras da ministra como uma ofensa aos mais vulneráveis e uma negação da pobreza extrema na ilha.

Que postura adotou Miguel Díaz-Canel diante das declarações da ministra Feitó?

Miguel Díaz-Canel se distanciou das declarações da ministra, reconhecendo a existência de pessoas em situação de rua e criticando os julgamentos superficiais sobre o assunto. No entanto, sua resposta foi vista por muitos como ambígua e evasiva, sem condenar abertamente a ministra.

Qual é a situação da pobreza em Cuba segundo relatórios recentes?

O Observatório Cubano de Direitos Humanos estima que 89% das famílias cubanas vive em situação de pobreza extrema. Além disso, estudos independentes e relatos visuais contradizem as afirmações oficiais, mostrando uma realidade de indigência e pobreza que o governo tenta ocultar.

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