O observatório independente Food Monitor Program (FMP) apresentou um relatório no qual explica que a atual crise que Cuba enfrenta não é apenas comparável ao Período Especial dos anos 90, mas a supera em intensidade, profundidade e deterioração acumulada.
Em um comunicado recente, a organização expôs por que considera que a situação econômica e social da ilha atingiu níveis sem precedentes em sua história republicana recente.
Segundo a FMP, a crise multifatorial que afeta o país desde 2018 se agravou nos últimos anos e transformou o cotidiano dos cubanos em uma experiência marcada pela escassez, o colapso dos serviços públicos, a inflação e a insegurança alimentar.
Ao contrário dos anos 90, a situação atual implica um deterioração mais abrangente, com múltiplos sistemas básicos em ruína simultaneamente, sem sinais de melhoria ou reformas reais por parte do Governo.
FMP argumentou que a inflação tem sido um dos fatores mais devastadores: entre 2021 e 2023, superou os 500 %, segundo estimativas independentes.
O poder aquisitivo dos salários e das pensões desabou frente ao custo de vida, e nesse sentido mencionou que um cartucho com 30 ovos hoje equivale a quase duas pensões básicas e um quilograma de leite custa o mesmo que o salário mínimo mensal.
O fenômeno inflacionário se soma a uma dolarização crescente da economia, que deixou a maioria da população sem acesso ao mercado formal.
As lojas em moeda nacional estão vazias ou desapareceram, e o mercado negro se tornou a única maneira de obter produtos básicos.
A queda dos serviços públicos aprofundou ainda mais a crise, e mencionou que o sistema elétrico, composto em sua maioria por Termoelétricas obsoletas com mais de 40 anos de uso, não consegue atender à demanda nacional.
Desde há cinco anos, são relatados apagões contínuos que chegam a durar até 16 horas diárias em vários territórios. Essa situação afeta diretamente a conservação de alimentos, a saúde, o descanso e o funcionamento mínimo da vida social.
O sistema de água potável também está colapsado, segundo FPM, e ressaltou que, no caso de Havana, por exemplo, no final de 2023 havia mais de 2.000 vazamentos não reparados.
Mais de meio milhão de pessoas não tem acesso estável a água corrente e muitas precisam armazená-la por conta própria.
Os esquemas de distribuição podem ter intervalos de até quatro dias, afetando gravemente a higiene e a capacidade de cozinhar alimentos de forma segura, ressaltou.
O gás liquefeito de petróleo, principal fonte de energia para cozinhar nos lares cubanos, enfrenta restrições severas desde 2019, segundo a FPM.
A situação se agravou em 2025, quando a interrupção na entrega do produto deixou 41% das famílias cubanas sem acesso a esse combustível.
Muitas tiveram que recorrer a métodos primitivos, como cozinhar com lenha ou carvão em fornos improvisados, o que implica riscos para a saúde e a segurança.
A falta de gás e eletricidade, muitas pessoas não conseguem ferver água nem preparar alimentos adequadamente, expondo a população ao risco de contrair doenças.
Segundo pesquisas do próprio FMP, mais de 76% das famílias tiveram sua capacidade de cozinhar afetada devido a cortes de eletricidade, e muitas reduziram o número de refeições diárias ou mudaram sua dieta para opções mais baratas e menos saudáveis.
A combinação dessas carências provocou uma situação de insegurança alimentar que obriga milhares de famílias a reorganizar seus horários de vida, permanecer em casa à espera da água ou modificar suas rotinas alimentares.
Este contexto gerou um aumento notável do mal-estar social, evidenciado em protestos comunitários, panelaços e manifestações espontâneas.
Entre elas, destaca a protesta do passado 22 de maio em Santiago de Cuba e Bayamo sob a consigna “Corrente e comida”, assim como outra que ocorreu em Pinar del Río cinco dias antes, após mais de 20 horas sem eletricidade.
Essas expressões de descontentamento surgem em um clima onde, segundo estudos do FMP, mais de 63% da população atribui a situação a uma má gestão governamental, enquanto apenas 8% responsabiliza o embargo estadounidense.
Longe de aplicar correções estruturais, o governo cubano respondeu com uma política repressiva que criminaliza aqueles que clamam por uma vida digna.
A FMP denunciou que a administração continua priorizando alianças ideológicas e clientelistas, buscando importar alimentos e energia sob esquemas subsidiados em vez de implementar um verdadeiro plano de recuperação.
O comunicado advertiu que não há vontade política para ajustar o modelo atual, o que mantém o país estagnado e o aproxima cada vez mais de estruturas autoritárias como as da China ou da Rússia.
Em sua conclusão, Food Monitor Program afirma que esta crise superou o Período Especial não apenas por seus efeitos visíveis, mas porque afeta simultaneamente os sistemas alimentar, energético, sanitário e econômico, sem que haja um horizonte de saída.
Além disso, denunciou a passividade de um regime que sobrevive através da captação de divisas sustentada no sacrifício das famílias cubanas e de sua diáspora.
Para alcançar uma recuperação real, afirmou o observatório, será imprescindível uma transformação profunda, com reformas estruturais, respeito à dignidade cidadã e uma reconciliação produtiva.
Nesse sentido, exigiu que seja garantido um nível de vida digno para todos os cubanos e que se abandone o imobilismo institucional que hoje sustenta a destruição sistemática do país.
Perguntas frequentes sobre a crise atual em Cuba
É a crise atual em Cuba pior do que o Período Especial?
A crise atual em Cuba é considerada pior do que o Período Especial dos anos 90, segundo o observatório independente Food Monitor Program (FMP). A situação atual ultrapassa em intensidade, profundidade e deterioração acumulada, afetando múltiplos sistemas essenciais simultaneamente, sem sinais de melhoria.
Quais são os principais fatores que agravam a crise em Cuba?
A inflação descontrolada, a escassez de produtos básicos e o colapso dos serviços públicos são os principais fatores que agravam a crise em Cuba. Entre 2021 e 2023, a inflação superou os 500%, enquanto a dolarização da economia deixou a maior parte da população sem acesso ao mercado formal.
Como a crise afeta a alimentação em Cuba?
A crise provocou uma insegurança alimentar severa, obrigando milhares de famílias a reorganizar seus horários de vida e modificar suas rotinas alimentares. Mais de 76% das famílias viram sua capacidade de cozinhar afetada devido aos cortes de energia, e muitas reduziram o número de refeições diárias.
Qual é o impacto da crise nos serviços públicos em Cuba?
O sistema elétrico e de abastecimento de água potável estão colapsados. Relatos indicam quedas de energia de até 16 horas diárias em vários locais, afetando a conservação de alimentos e a saúde. Mais de meio milhão de pessoas não tem acesso estável a água corrente, o que agrava a higiene e a capacidade de cozinhar alimentos de maneira segura.
Qual é a resposta do governo cubano diante da crise atual?
O governo cubano optou por uma política repressiva em vez de implementar as reformas estruturais necessárias para melhorar a situação. Alianças ideológicas e clientelistas são priorizadas em lugar de um plano de recuperação real, o que mantém o país estagnado e em um estado de deterioração contínua.
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