Raúl Castro: "Ainda sou jovem! Alguém tem alguma dúvida?"

Aos 93 anos, Raúl Castro gasta suas últimas balas de poder em Cuba, buscando perpetuar o regime castrista apesar de sua ilegitimidade, das promessas não cumpridas, da crescente crise econômica, do maior êxodo de cubanos da história e da fragilidade da liderança da chamada "continuidade".


Durante a VI Conferência Nacional da Associação dos Combatentes da Revolução Cubana, o general Raúl Castro lançou um de seus habituais gritos com uma voz de virilidade impostada ao exclamar: “¡Estou jovem ainda! Alguém tem alguma dúvida?”.

Com um pé no estribo imaginário de seus apologistas, o ditador nonagenário dispara seus últimos e inúteis cartuchos para alcançar o paraíso prometido do castrismo: conseguir a perpetuidade do regime através da deificação da chamada “revolução” e seus líderes.

A quase 94 anos, o que foi um jovem rebelde com voz aflautada e pálido pela constante sombra de seu irmão, reafirmou nesta segunda-feira sua intenção de continuar sendo uma figura central dentro do poder em Cuba, apesar de ter designado como governante a Miguel Díaz-Canel. Ou precisamente por isso.

A afirmação senil de sua juventude, transmitida pelo Noticiero Nacional de Televisión (NTV), evidencia sua desesperação em manter o papel de líder de fato do regime cubano, e a “continuidade” do mesmo para o bem das famílias que constituem o entrelaçamento de poder mafioso e violento que capturou o Estado há mais de 60 anos.

Após se apoderar da nação, de sua riqueza, despojar os cubanos de direitos e liberdades, submetê-los ao comando da ideologia comunista e destruir o indivíduo e a sociedade civil, aquele que herdou o poder de um decrépito Fidel Castro, pretende legar a seus herdeiros um “capitalismo de compadres” que consolide sua posição oligárquica e privilegiada em uma Cuba pós-comunista repleta de pobreza, desigualdade e desesperança.

De segundón a sucessor de Fidel Castro

Raúl Castro sempre operou à sombra de seu irmão, mas sua ascensão ao poder foi uma consequência natural da dinâmica do regime cubano. Em 2006, assumiu a direção do país de forma interina após a doença do "comandante", e em 2008 foi formalmente designado presidente do Conselho de Estado e de Ministros.

Desde então, apresentou-se como um reformista, mas suas medidas foram insuficientes para solucionar a grave crise econômica do país. Seu principal "feito" na década em que governou foi o restabelecimento das relações diplomáticas com os Estados Unidos sob a administração de Barack Obama.

Para a história da covardia e da infâmia ficou a imagem do ditador levantando o braço flácido de Obama, como presa capturada em uma caça geopolítica, grasnando intimidadoramente diante da imprensa estrangeira que questionava sobre os prisioneiros políticos.

Depois chegaram os "grilos" de seu filho, o coronel da Inteligência Alejandro Castro Espín, aos ouvidos dos funcionários da Embaixada dos EUA em Havana; e chegou Donald Trump e acabou a "festa" que deixava o velho general tão nervoso, apenas tranquilo com seu neto Raúl Guillermo Rodríguez Castro, apelidado de "El Cangrejo", protegendo suas costas, e o pai deste, o falecido Luis Alberto Rodríguez López-Calleja, guardando seus recursos nos cofres do Grupo de Administração Empresarial S.A. (GAESA).

A evidência mostrou o terror que produziu o aproximamento a Washington no já idoso governante e que o levou a desacelerar seu suposto programa de reformas, redobrar a repressão contra opositores e jornalistas independentes, e voltar a buscar a sombra de “irmãos mais velhos” mais poderosos como China e Rússia.

Promessas não cumpridas e o copo de leite que nunca chegou

Uno dos episódios mais lembrados de seu mandato foi a promessa de garantir um "copo de leite para todos os cubanos", anunciada em 2007.

Esta declaração, que pretendia simbolizar uma melhoria na qualidade de vida da população, nunca foi cumprida. De fato, a escassez de alimentos e produtos básicos tem sido uma constante em sua gestão e na do seu sucessor.

A realidade econômica da ilha tem continuado a se deteriorar, com um sistema produtivo ineficaz, a dependência das remessas do exterior e as crises de seus principais aliados, Venezuela e Rússia, agora envolvida em uma guerra da qual apenas Deus sabe como o regime cubano deseja que termine.

A designação de Díaz-Canel e o controle nas sombras

Em 2018, Raúl cede a presidência para Díaz-Canel, em um que foi uma transferência de poder controlada e supervisionada pela chamada “velha guarda revolucionária”.

Embora o governante designado tenha tentado projetar uma imagem de renovação, sua ação focou ainda mais em favorecer a oligarquia daqueles que "amam o amor e odeiam o ódio", agitando as velhas bandeiras e slogans do castrismo sem Fidel.

Raúl manteve a direção do Partido Comunista até 2021, quando formalmente se aposentou e cedeu novamente o bastão (que não o comando) ao líder da “continuidade”.

Este se coronou como primeiro secretário do órgão, doutorou-se, doutorou a sua esposa, Lis Cuesta Peraza, nomeou o filho dela como assessor pessoal, Manuel Anido Cuesta, e três espetáculos da La Colmenita depois, se destacou como sogro da estrelinha Ana de Armas, talvez o único “sucesso” que possa exibir em sua função.

A estratégia de Castro tem sido clara: garantir que o poder permaneça nas mãos dos mesmos de sempre, distribuindo migalhas entre os fiéis de segunda fila e escudeiros mipymeros de terceira. Assim, ele pensa conseguir que o legado da "revolução" continue além de sua existência.

Nesse contexto, suas recentes declarações na conferência de combatentes tentam reforçar seu já precário papel como garantidor da estabilidade do regime.

Uma "juventude" política que busca a eternidade do castrismo

A frase "Estou jovem ainda" não é apenas um desafio à passagem inexorável do tempo, mas também envia uma mensagem clara àqueles que possam pensar que sua era chegou ao fim. Raúl Castro continua sendo o fator determinante nas decisões do país e sua presença em eventos-chave do regime é uma demonstração do fetichismo de seus herdeiros.

Ao longo de sua trajetória, ele demonstrou que sabe se adaptar a esses revés que a retórica transforma em “vitórias” (um talento especial dos ditadores), mas sem ceder um milímetro no essencial: o controle absoluto do poder. Sua mensagem desta segunda-feira é uma reafirmação de que o castrismo não tem intenção de desaparecer e que a dinâmica do poder em Cuba continua a mesma há décadas.

No entanto, o contexto atual é diferente: a crise econômica se agravou, a emigração atingiu níveis históricos e a inconformidade social se manifestou em protestos sem precedentes. Embora Raúl proclame a falácia de sua "juventude", a realidade indica que o sistema que representa enfrenta uma crise de legitimidade e sustentabilidade.

O legado de um líder que não se retira

A aparição de Raúl Castro na conferência de combatentes e sua mensagem desafiadora são uma demonstração de como o castrismo continua agarrado ao poder. Sua "juventude" é puro instinto de sobrevivência e responde à necessidade de manter vivo o regime que construiu junto a seu irmão.

Em um país mergulhado na crise que ele mesmo anunciou, com um povo cansado de promessas não cumpridas e uma geração jovem que busca oportunidades fora da ilha, a pergunta que muitos se fazem não é se Raúl ainda é jovem, mas se seu modelo político tem futuro.

Por enquanto, a resposta do regime continua sendo a mesma de sempre: continuidade e controle absoluto, sem espaço para a transição democrática. E quanto à longevidade de Raúl, até o portal britânico Deathlist.net não o inclui em seu listado de 2025. Será que o considera eterno, ou que já não é famoso e não passa de um cadáver político do regime que ajudou a fundar?

"Vocês ouviram lá de fora? E os de lá? Pois a situação está boa", perguntou e sentenciou Raúl antes de deixar, nesta segunda-feira, seus veteranos correligionários no salão. Com gritos e aplausos, eles disseram que sim, que ouviram suas palavras. Será que os do além também as ouviram?

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Iván León

Licenciado em jornalismo. Mestrado em Diplomacia e Relações Internacionais pela Escola Diplomática de Madri. Mestrado em Relações Internacionais e Integração Europeia pela UAB.

Iván León

Licenciado em jornalismo. Mestrado em Diplomacia e Relações Internacionais pela Escola Diplomática de Madri. Mestrado em Relações Internacionais e Integração Europeia pela UAB.