Régimen anuncia "mudanças estruturais" na economia de Cuba, mas dentro do "modelo socialista"

O governo de Miguel Díaz-Canel insiste em realizar mudanças econômicas estruturais sem alterar o modelo socialista, embora os analistas independentes critiquem a falta de reformas reais e destaquem o ciclo de promessas não cumpridas.

Imagem de referência criada com Inteligência ArtificialFoto © CiberCuba / Grok

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O regime cubano reiterou sua intenção de introduzir "mudanças estruturais" na economia, mas deixou claro que estas serão realizadas dentro dos limites do "modelo socialista".

Assim manifestaram vários economistas oficialistas durante a recente emissão do programa televisivo Cuadrando la Caja, no qual defenderam a necessidade de reformas, mas sob o controle do Estado e com o Partido Comunista como gestor absoluto.

Captura de tela X / @pmmonreal

No entanto, a proposta de transformações estruturais não convence analistas independentes. O economista Pedro Monreal criticou a narrativa governamental, apontando que o debate oficial evita aprofundar-se na crise estrutural que o país enfrenta, fruto de reformas anteriores fracassadas promovidas pelo próprio governo.

“Se hoje se fala em mudança estrutural é porque previamente o governo impôs uma mudança estrutural falida que culminou em crise”, afirmou em uma série de mensagens em sua conta no X (antigo Twitter).

O discurso oficial: Mudanças sem ruptura

Durante o programa televisivo, os painelistas insistiram que uma "mudança estrutural" não implica necessariamente uma "mudança de regime" e que o socialismo deve ser fortalecido, não substituído.

O ex-ministro de Finanças e Preços, José Luis Rodríguez, afirmou que a proporção atual da economia cubana não é sustentável, com o setor estatal gerando 84% do PIB, enquanto o setor privado, embora em crescimento, continua a representar uma fração menor.

Por sua vez, o ex-espião e economista Ramón Labañino sublinhou que o objetivo do governo é "salvar o modelo socialista baseado no marxismo e no leninismo". Em outubro de 2024, e a partir da Espanha, onde uma de suas filhas estava cursando estudos de pós-graduação, Labañino afirmou que “as Mipymes em Cuba estão para fortalecer o socialismo”.

Além disso, criticou os economistas que sugerem uma transição para um sistema de mercado mais aberto, afirmando que permitir o livre mercado conduziria inevitavelmente à "concentração da propriedade e da riqueza, o que nos levaria ao capitalismo".

A resistência a reformas de fundo

Em suas declarações, os economistas oficiais argumentaram que o principal problema econômico de Cuba reside na necessidade de reorganizar sua estrutura produtiva, melhorar a produtividade e controlar a inflação.

No entanto, evitaram mencionar temas-chave como a liberdade de mercado, a privatização de setores produtivos estratégicos ou a abertura econômica sem restrições estatais.

Monreal destacou que o programa evitou discutir conceitos fundamentais como "produtividade" e "receitas", essenciais para qualquer transformação econômica real. Além disso, criticou que se despreze economistas independentes sob a qualificação de "gurus" enquanto o governo insiste em apresentar medidas sem substância concreta.

Reformas anteriores e suas falhas

O discurso oficial sobre "mudanças estruturais" chega após várias tentativas de ajuste econômico que terminaram agravando a crise do país.

A chamada Tarefa de Ordenamento, que em 2021 buscava unificar a moeda e reestruturar salários e preços, gerou uma hiperinfl ação e uma queda do poder de compra dos cubanos.

Além disso, a tentativa de impulsionar as micro, pequenas e médias empresas (Mipymes) tem sido objeto de controvérsia, pois muitos as veem como uma ferramenta de sobrevivência do regime através da criação de um tecido clientelista de “novos atores da economia”, mais do que uma verdadeira mudança na estrutura produtiva do país.

En este sentido, varios informes han señalado cómo o regime tem promovido o cooperativismo como uma solução, mas sem conceder às cooperativas uma verdadeira independência do Estado. Ao mesmo tempo, tem "experimentado" com o orçamento estatal, ajustando subsídios e cortes, mas sem uma estratégia clara para dinamizar a economia.

A economia cubana em um ponto crítico

O contexto em que se propõe essa outra "mudança estrutural" não poderia ser mais crítico. A inflação descontrolada, a crise alimentar e a incapacidade do governo de atrair investimento estrangeiro mergulharam a economia em um profundo estancamento.

As promessas de “perfeccionar o socialismo” e torná-lo “mais próspero e sustentável” têm sido uma constante no discurso do governante Miguel Díaz-Canel, mas os resultados não têm sido tangíveis para a maioria dos cubanos, que enfrentam diariamente uma situação cada vez mais precária.

Um ciclo repetitivo de falsas promessas

Desde há décadas, o regime tem insistido na ideia de "aperfeiçoar o modelo socialista" como a solução para os problemas econômicos do país. Reiteradas vezes, Díaz-Canel tem promovido planos de "atualização" ou "retificação" do modelo sem que estes representem mudanças estruturais reais.

Em 2024, reafirmou que Cuba continuaria "aperfeiçoando sua economia socialista" sem abrir espaço a reformas que permitam a autonomia do setor privado. Em 2023, Díaz-Canel reconheceu a crise econômica, mas descartou qualquer mudança significativa e reafirmou seu compromisso com a "construção do socialismo" apesar do fracasso de suas políticas.

A lo longo dos anos, o discurso oficial de a "revolução eterna" que prega a "continuidade" tem sido cíclico: insistência no "aperfeiçoamento" sem assumir reformas profundas. A questão agora está em saber se o regime está disposto a implementar mudanças efetivas ou se se trata de outra estratégia para ganhar tempo sem resolver os problemas estruturais do país.

Rumo a um capitalismo de Estado?

A despeito da retórica oficial de rejeição ao capitalismo, as reformas econômicas impulsionadas pelo regime podem estar direcionando Cuba para um capitalismo de Estado, um modelo em que o governo mantém o controle político absoluto, mas permite uma economia com características de mercado reguladas pelo Estado, semelhante ao que tem sido observado na China ou na Rússia.

Este tipo de sistema tende a aprofundar a desigualdade, uma vez que o Estado continua sendo o principal ator econômico, mas concede espaços privilegiados a certos setores empresariais aliados ao poder. Em vez de promover uma verdadeira descentralização econômica, corre-se o risco de consolidar uma elite burocrática com acesso aos principais recursos, enquanto a maioria da população permanece presa à precariedade.

Em países como a China e a Rússia, o capitalismo de Estado gerou grandes desigualdades sociais, corrupção estrutural e concentração de riqueza em grupos privilegiados próximos ao governo. Se Cuba seguir por esse caminho, o resultado pode ser uma economia com mais injustiças do que as de sistemas capitalistas liberais, onde pelo menos existem mecanismos de competição, mobilidade econômica e uma maior diversificação do poder.

A pergunta chave é se o regime cubano está realmente disposto a realizar mudanças que beneficiem toda a população ou se seu objetivo é, simplesmente, transformar a economia o suficiente para garantir sua própria sobrevivência política e o controle absoluto do país.

Possíveis cenários futuros resultantes das "mudanças estruturais" da "continuidade"

A política económica de Díaz-Canel, ao promover "mudanças estruturais" sem alterar o regime político, aponta para um cenário de ajustes limitados que não resolvem os problemas de fundo.

Em vez de uma transformação real que permita o desenvolvimento de um mercado mais dinâmico e descentralizado, o modelo cubano continua preso a uma lógica de reformas controladas que buscam aliviar as tensões econômicas sem ceder poder nem modificar o monopólio estatal sobre a economia.

Isso pode resultar em vários cenários possíveis:

1. Estagnação prolongada: Sem reformas estruturais que incluam maior abertura econômica, descentralização produtiva e uma verdadeira autonomia para o setor privado, a crise econômica continuará se aprofundando. A inflação, a escassez e a falta de investimento estrangeiro continuariam erodindo o nível de vida da população.

2. Maior dependência de aliados externos: Dado que o modelo econômico atual é incapaz de gerar receitas suficientes, o governo continuará apostando no apoio financeiro de aliados estratégicos como Rússia, China e o bloco BRICS. No entanto, essa dependência pode não ser sustentável a longo prazo.

3. Reformas incompletas que não resolvem a crise: Como tem sido observado com as Mipymes e a bancarização, o regime implementa mudanças limitadas para mitigar o deterioro econômico, mas sem permitir uma liberalização real. Essas medidas podem aliviar temporariamente alguns problemas, mas não conseguem reverter a crise estrutural.

4. Maior controle e repressão: Para sustentar o modelo sem fazer concessões econômicas reais, o governo poderia recorrer a maiores controles, restrições e repressão contra o descontentamento social, criminalizando ainda mais a atividade privada e a oposição política.

Em definitiva, sem uma mudança política que permita uma maior flexibilidade econômica, Cuba continuará em um ciclo de crises recorrentes, com pequenas aberturas que não conseguem gerar uma mudança real e sustentável.

Arquivado em:

Iván León

Licenciado em jornalismo. Mestrado em Diplomacia e Relações Internacionais pela Escola Diplomática de Madri. Mestrado em Relações Internacionais e Integração Europeia pela UAB.