A Revolução Cubana ou como acabar com 4 séculos de pecuária em uma geração

Em 1956, Cuba tinha 6,7 milhões de pessoas e um setor pecuário com 6 milhões de cabeças de gado. Hoje, os bezerros morrem de fome, a carne bovina é desconhecida e proliferam os matadores que operam clandestinamente para sobreviver.

Cebú de 3 años y medio y dos mil libras, 1957/ vaca cubana 2024 © CiberCuba
Cebú de 3 anos e meio e duas mil libras, 1957/ vaca cubana 2024Foto © CiberCuba

Em 1956, a população de Cuba era de 6 milhões e 676 mil pessoas. O cebú era a raça predominante nos pastos cubanos, com 6 milhões de cabeças de gado, o que equivalia aproximadamente a 0,90 bovinos por habitante.

Isso sem contar o gado menor, que somava um total de 4 milhões 280 mil exemplares, incluindo 500 mil equinos, 3 milhões 400 mil suínos e 200 mil ovinos, entre outros.

Segundo a FAO em 1953, Cuba ocupava uma boa posição em gado por habitante entre os 36 países mais importantes. Além disso, ficava apenas abaixo da Argentina, Uruguai e Brasil, que eram na época os principais exportadores de carne na América Latina. Portanto, ocupar o quarto lugar era uma posição de honra para um país cujo setor econômico fundamental era a indústria açucareira, não a pecuária.

Associação Nacional de Pecuaristas de Cuba 1953

Segundo a publicação da Associação Nacional de Pecuaristas de Cuba de 1956, 30 setores da economia nacional se beneficiavam direta ou indiretamente do gado bovino e seus produtos.

Com um investimento de 1.451 milhões de dólares, este setor gerava quase 342 mil postos de trabalho e mais de 105 milhões de dólares em salários e remunerações.

Na ilha havia, para mencionar alguns desses setores, 718 laticínios (com 350 mil vacas leiteiras), 27 fábricas de carne seca, 502 comércios de sorvete, 153 curtumes, 4 fábricas de leite em pó, 23 fábricas de queijo, 18 de manteiga, 10 de sorvete e 2.962 pelarias, entre outros.

Nem mesmo as guerras conseguiram acabar com a pecuária cubana.

Em 1868, durante a Guerra dos Dez Anos, os pastos ficaram devastados e foi necessário reconstruí-los. As plantações de café, os engenhos de açúcar e os grandes estoques de gado foram utilizados para arrecadar dinheiro ou alimentar as tropas.

Para 1894, na véspera do Grito de Baire, os pastos contavam com 2 milhões 485 mil cabeças de gado. No entanto, em 1899, ao finalizar a guerra e com a ocupação americana da ilha, um censo registrou apenas 376 mil cabeças de gado. Com a riqueza pecuária totalmente devastada e diante da necessidade de alimentar os trabalhadores e sustentar as atividades agrárias, foram implementadas facilidades tarifárias para reconstruir a pecuária na ilha. Foram introduzidos gados de La Florida, Texas, Tampico, Porto Rico e Venezuela. Os pecuaristas se dedicaram a restabelecer essa riqueza, e em 1910 já havia um rebanho de mais de 3 milhões de cabeças de gado.

A Primeira Guerra Mundial em 1914 foi mais um duro teste para a pecuária cubana. A importação de alimentos foi drasticamente reduzida, e a enorme demanda de açúcar e tabaco obrigou a utilizar bois para o cultivo e transporte de cana, essenciais para as grandes safras e a criação dos engenhos açucareiros. Com a Reforma Tarifária de 1927, foram criadas indústrias de derivados que permitiram o desenvolvimento e crescimento de produtos nacionais, eliminando a necessidade de importações.

Em 1945, durante a Segunda Guerra Mundial, foi relatada a maior demanda de gado para abastecimento em toda a história. Em 1952, em um censo que durou 100 dias e no qual não foi possível visitar todas as fazendas, foram registradas 5 milhões e 300 mil cabeças de gado.

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Desde 1959, a massa bovina não deixou de diminuir. O governo inicialmente responsabilizou os atos de sabotagem e a oposição interna.

Em 1990, apesar de que a população da ilha era de 11 milhões de habitantes, o rebanho bovino foi reduzido a apenas 4,8 milhões de cabeças, e apenas cerca de 20% dessas pertenciam a produtores privados (cooperativas).

O mau manejo da pecuária cubana que contribuiu para a crise pode ser atribuído a vários fatores estruturais e decisões políticas que geraram uma alta dependência externa e um sistema pouco adaptável. Os principais problemas foram:

Dependência de insumos importados: A pecuária cubana dependia em grande medida de insumos externos, como fertilizantes, pesticidas, arames, maquinaria agrícola, combustíveis e matérias-primas para a preparação de concentrados. Quando ocorreu a crise econômica e as importações foram reduzidas, o sistema não conseguiu se sustentar.

Sistema de produção intensivo e caro: O modelo cubano baseava-se em um sistema intensivo que exigia uma grande infraestrutura, incluindo tratores, caminhões e maquinário para distribuir alimentos e gerenciar as atividades pecuárias. Isso gerou altos custos e uma vulnerabilidade crítica a qualquer interrupção no fornecimento de recursos.

Incapacidade para se adaptar a condições climáticas adversas: A falta de capacidade de resposta diante de secas e mudanças climáticas foi um fator chave. Os pastos e forragens, essenciais na alimentação do gado, se deterioraram rapidamente pela falta de fertilizantes e água. Além disso, não havia uma estratégia efetiva para gerenciar essas contingências de maneira sustentável.

Fallo na gestão genética e reprodução: A implementação da inseminação artificial, embora inicialmente bem-sucedida, tornou-se insustentável devido à falta de insumos necessários como nitrogênio líquido e equipamentos. Isso forçou um retorno a métodos menos eficientes, como a monta direta, afetando negativamente a produtividade e a qualidade genética dos rebanhos.

Mala planificação do uso da terra e manejo de pastagens: A falta de fertilizantes e pesticidas provocou a degradação e a infestação de pastagens com plantas daninhas, como o aroma e o marabú, afetando mais de um milhão de hectares de terras agrícolas. A salinidade também desempenhou um papel na perda da qualidade das terras, o que não foi gerido adequadamente.

Dependência da indústria açucareira: O sistema pecuário cubano estava estreitamente vinculado à indústria açucareira, já que muitos dos subprodutos desta eram essenciais para a alimentação do gado. A crise também afetou essa indústria, reduzindo a produção de açúcar e mel, o que repercutiu negativamente na pecuária.

Em resumo, a crise na pecuária cubana resultou de uma combinação de dependência externa, falta de adaptabilidade no sistema produtivo e má gestão de recursos e terras, o que levou ao colapso do setor ao enfrentar a crise econômica.

Os censos oficiais atuais não registram com precisão as mortes, furtos e sacrifícios ilegais de gado, por isso não são confiáveis. Em 2023, em Havana morreram mais vacas do que nasceram, e as autoridades afirmam que uma das principais causas dos falecimentos foi a desnutrição, principalmente em bezerros.

Estima-se que o país atinja apenas a cifra de 3 milhões 645 mil cabeças de gado para uma população de quase 10 milhões de habitantes.

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