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O cineasta León Ichaso, figura proeminente do cinema cubano no exílio e da cultura hispânica nos Estados Unidos, faleceu na madrugada deste domingo aos 74 anos devido a um ataque cardíaco, conforme confirmaram fontes da família ao CiberCuba.
Havia saído recentemente com sucesso de um tratamento contra o câncer e se preparava para uma reunião familiar em Miami, adiada por mais de três anos.
"Hoje é o dia mais horrível da minha vida. Meu adorado irmão León Ichaso faleceu hoje de um ataque cardíaco massivo em seu apartamento em Los Angeles. O que ninguém poderia imaginar! Uma pessoa brilhante, cheia de vida, curiosidade, com um grande espírito jovem e sonhos sobre tudo. Um ser único e todos que o conheciam sabem disso. Estou destroçada", comunicou à CiberCuba sua irmã, a jornalista e realizadora Mari Rodríguez Ichaso, em uma mensagem comovente.
Ichaso deixou uma marca em temas cubanos que se destaca em seu primeiro longa-metragem em espanhol, El Súper (1979), considerado um filme emblemático do drama do exílio, assim como em Azúcar amarga (1996) e Paraíso (2009). No entanto, sua obra possui múltiplos marcos em telefilmes e produções biográficas em Hollywood e na televisão americana.
“El poeta do Nova York latino”, como o chamaram alguns cineastas, e “O Scorsese dos salseros de Nova York”, como o chamou o jornal The New York Times, deixou, com sua morte, uma filmografia que se constitui em um arquivo de visita obrigatória para compreender o drama migratório latino em busca do sonho americano.
Rodríguez lembrou que muitas portas foram fechadas para seu irmão em Hollywood devido à sua rejeição aberta ao regime de Fidel Castro.
É importante destacar que sua posição anti-Castro lhe trouxe muitos prejuízos no mundo de Hollywood. Por isso, ele renunciou a inúmeros trabalhos que não eram claros nesse aspecto. Quando fez Azúcar amarga, muitos produtores o criticaram bastante por sua 'obsessão' anticastrista", declarou Rodríguez, que mencionou a posição de seu irmão em oposição a Donald Trump, "porque ele o lembrava precisamente do castrismo e dos perseguidores políticos".
Mais de quatro décadas de trabalho na grande tela legitimam Ichaso como um artista comprometido com sua criação.
A perda, o espaço de hibridação cultural dos migrantes, a nostalgia, foram temas transversais em sua obra que sempre encontraram em Cuba um tópico de motivação.
Filho de Antonia Ichaso, escritora de rádio e televisão, e de Justo Rodríguez Santos, venerado poeta e membro do grupo Orígenes, Ichaso deixou Cuba rumo ao México aos 14 anos, acompanhado de sua mãe e sua irmã, enquanto o pai permaneceu em Havana devido às suas simpatias pela revolução cubana. No entanto, alguns anos depois, acabou se decepcionando com a mudança dos acontecimentos e se juntou à família nos Estados Unidos em 1968.
Ichaso rodou seu primeiro filme em 1967 e, desde então, dedicou-se ao cinema e à televisão, dirigindo figuras célebres como Rubén Blades, Marc Anthony, Jennifer López, Wesley Snipes e Peter Coyote.
El Súper, uma produção que estreou em 1979, conquistou o reconhecimento da crítica nos Estados Unidos, garantiu um lugar na historiografia do cinema cubano do exílio e se tornou um clássico.
Baseado em uma peça da Broadway sobre um superintendente de edifícios imigrante que tenta conquistar seu espaço em Nova York, com El Súper, surgiu na indústria cinematográfica como o cronista das dificuldades enfrentadas pelos migrantes que buscam o sucesso nos Estados Unidos.
Dando voz ao mundo da salsa latina em Nova York, onde se estabeleceu, e fiel às suas raízes, rodou Crossover Dreams (1985), onde o músico panamenho Rubén Blades interpreta Rudy Veloz, um promissor cantor de salsa que sonha em alcançar o auge do sucesso.
O filme, talvez pela presença de Rubén Blades e por não abordar temas sensíveis ao regime cubano, foi exibido durante o Festival de Cinema de Havana em 1985.
Sua imersão nas identidades latinas que se encontram na cidade mais icônica do mundo o levou a dirigir Piñero e El Cantante, baseado na vida de Héctor Lavoe, o popular salsero porto-riquenho que faleceu de aids aos 46 anos em 1993.
El Cantante foi protagonizado por Marc Anthony, no papel de Héctor Lavoe, e Jennifer López, como sua esposa, Puchi.
Anthony y López, que foram uma das produtoras do filme, pediram expressamente a Ichaso que dirigisse a obra.
"Com El Cantante, estou me preparando para que algo grande aconteça, o grande avanço, mas também estou me preparando para uma grande decepção. Não acredito que será o caso, mas se for, não vou chorar. Sempre tenho um paraquedas aguardando", disse em uma entrevista por ocasião da estreia do filme.
Esse "paracaídas" foi Paraíso, de 2009, onde retratou a tragédia de um balsero cubano recém-chegado a Miami, ignorante dos códigos e normas de outra sociedade, um outsider, deslocado, sem conseguir se encaixar em nenhum dos lugares.
Com um orçamento mínimo de $30.000 dólares, Ichaso filmou Paraíso, normalmente nas ruas de Miami, sem permissões, contando com a ajuda de amigos e familiares. Isso representou um desafio, mas também um estímulo criativo.
Diverso, internacional, mas também pessoal, seu cinema inclui, além de Sugar Hill (1994), Execution of Justice (1999), Hendrix (2000), The Fear Inside (1992), Zooman (1995) e Free of Eden (1999), mas não se limita a isso. Na televisão, dirigiu episódios da série Miami Vice por volta de 1984.
Nesse espaço liminal entre o cinema de Hollywood (Piñero, Sugar Hill, Medium e The Cleaner) e projetos menores e mais pessoais como Paraíso, Ichaso deixou sua marca na indústria cinematográfica e nos legou histórias que se tornaram imortais graças à sua obra.
"Sinto que estou compartilhando um segredo: 'Aqui, toma. Vou te passar'", comentou em uma entrevista. "Isso é uma grande alegria, como levar alguém ao seu restaurante favorito ou deixá-lo ouvir sua música preferida. A maioria dos mundos que levo as pessoas ainda não conheceu. Mas uma vez que os descobrem, tendem a ficar."
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