O governante nicaraguense Daniel Ortega pretende impulsionar uma reforma constitucional que consolidará o poder absoluto de sua família no país. A iniciativa propõe a criação das figuras de "copresidente" e "copresidenta", designando sua esposa e atual vice-presidente, Rosario Murillo, para um papel compartilhado na liderança do Estado.
Com essa reforma, Ortega e Murillo não apenas reforçariam seu controle sobre o Executivo, mas também coordenariam de forma oficial os poderes Legislativo, Judiciário e Eleitoral, eliminando qualquer independência entre eles.
O projeto, que modifica mais de 100 artigos da Constituição, também amplia o período presidencial de cinco para seis anos e estabelece que os copresidentes, eleitos por sufrágio universal, terão imunidade durante o seu mandato.
Além disso, segundo a BBC, o texto legaliza a criação dos chamados "polícias voluntários", grupos paramilitares acusados de violar direitos humanos durante os protestos antigovernamentais de 2018.
Além disso, a reforma introduz novas restrições à liberdade de expressão, limitando-a a quando "não transgredir os princípios de segurança, paz e bem-estar" definidos pela Constituição. Ela também oficializa como símbolo pátrio a bandeira do Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), colocando-a no mesmo nível que os emblemas nacionais.
Com uma Assembleia Nacional dominada pelo governo, a aprovação da reforma é iminente. O presidente da Câmara, Gustavo Porras, confirmou que o trâmite será tratado com urgência e poderá ser aprovado nos próximos dias.
A resposta da oposição e da comunidade internacional
A oposição, em sua maioria exilada após a repressão governamental, condenou veementemente a reforma.
Félix Maradiaga, figura destacada da dissidência, qualificou a medida como "a formalização em papel da ditadura bicéfala que já existe na Nicarágua". Por sua vez, Juan Sebastián Chamorro apontou que a reforma elimina qualquer separação de poderes e consolida um regime autoritário liderado por Ortega e Murillo.
A Organização dos Estados Americanos (OEA) também rejeitou a iniciativa, qualificando-a como uma "aberração que institucionaliza uma ditadura matrimonial". Em um comunicado, a OEA instou o governo nicaraguense a restabelecer a democracia e realizar eleições livres e legítimas.
Um tandem político sem precedentes
A figura de Rosario Murillo, conhecida por seu estilo excêntrico e sua inclinação ao esoterismo, ganhou destaque nas decisões governamentais desde que assumiu como vice-presidente em 2017.
Segundo analistas, Murillo atua de fato como copresidenta, tomando decisões estratégicas e executivas no governo.
Com esta reforma, seu papel seria oficializado, estabelecendo uma liderança conjunta que alguns críticos compararam a um modelo de "rei e rainha", que fere os princípios republicanos, segundo El País.
A reforma constitucional marca um ponto sem retorno na concentração de poder na Nicarágua. Ao eliminar as barreiras entre os poderes do Estado, Ortega e Murillo reforçam seu controle sobre todas as instituições, garantindo sua permanência no poder e enfraquecendo qualquer forma de oposição interna.
Enquanto isso, com exceção de Cuba, Venezuela e outros aliados como Rússia e Irã, a comunidade internacional continua denunciando o retrocesso democrático na Nicarágua, onde a repressão, o exílio forçado de opositores e a censura a meios de comunicação independentes se tornaram uma constante.
A reforma não apenas reafirma esse autoritarismo, mas pretende legitimá-lo a nível constitucional, aprofundando a crise política, social e econômica que o país enfrenta.
O futuro do regime nicaraguense, sob o comando de Ortega e Murillo, parece estar marcado por um sistema de partido único e a repressão sistemática de qualquer dissidência, consolidando uma dinastia familiar que ameaça se perpetuar no poder.
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