A psicologia do trauma: como o regime mantém a esperança apesar da crise

O regime em Cuba alimenta a imagem de uma população heroica que resiste contra um inimigo externo, mantendo assim um ciclo de promessas vazias e culpas alheias que perpetuam a crise e a desesperança na ilha.

Basurero en Cuba y Fidel Castro © Foto © CiberCuba y Wikipedia
Basurero em Cuba e Fidel CastroFoto © CiberCuba e Wikipedia

Em Cuba, basta acender a televisão por uma hora para receber uma mensagem que, segundo os dirigentes, busca acalmar as preocupações da população e convencê-la de que, eventualmente, tudo se resolverá. A narrativa oficial se apresenta como uma tentativa de proporcionar segurança em meio ao caos, assegurando que há “disponibilidade de combustível” e que o sistema elétrico está sendo restabelecido, embora não em plena capacidade. Repete-se a promessa de que “em breve tudo ficará interconectado”, como se essa simples afirmação fosse suficiente para aliviar as angústias diárias. No entanto, por trás desse falso sentimento de esperança, chega a dura realidade: mesmo em plena capacidade, o sistema não conseguirá atender toda a demanda, e os apagões continuarão a ser uma constante no futuro próximo. Diante dessas situações, os cubanos vivem em um estado constante de incerteza e angústia, uma sensação que, como muitos expressam, "marca o dia a dia" e se torna um sofrimento coletivo.

A Revolução Cubana soube manipular esse trauma para perpetuar um estado de dependência e resignação na população. Com um domínio da linguagem energética — que se soma à cultura meteorológica imposta por anos de furacões e ciclones — os cubanos se tornaram especialistas em termos como “patanas turcas”, “barcos com fueloil”, “grupos geradores”, “sistema elétrico nacional”, “geração distribuída e flutuante” e “microsistemas conectados”. Dominam o nome de todas as termelétricas do país e são capazes de reconhecer pelo som que ocorre no momento em que a luz se apaga a gravidade da falha: "a luz foi", "explodiu um transformador", "agora sim, isso é pra longo". Esse conhecimento não surge da tecnocracia, mas da repetição forçada e da necessidade de sobreviver em um país onde a linguagem da escassez e da crise se tornou parte da identidade nacional.

A despeito disso, o regime continua promovendo uma confiança cega de que, eventualmente, tudo sairá bem. Os cubanos são assegurados de que, embora não haja comida suficiente, "o pão está garantido". No entanto, nas ruas de Havana e em outras cidades, os vizinhos relatam ter visto pessoas recolhendo comida estragada do lixo, resultado da falta de refrigeração. “Isso eu fervo e coloco limão e preparo porque faz dias que não como nada”, comenta um dos afetados, ilustrando a desespero e a necessidade de adaptação que muitos enfrentam, mas também uma nova normalidade.

O governo utilizou a psicologia do trauma para submeter o povo, explorando o discurso do “bloqueio” como um mantra que evita toda responsabilidade interna. Ao culpar sempre fatores externos, elude a análise crítica de suas próprias falhas. Essa estratégia de manipulação, baseada em alimentar a desesperança e oferecer promessas vazias, mantém a população em um estado de indefensão aprendida, onde o ciclo de crises e soluções superficiais se repete, mantendo o controle e evitando qualquer questionamento profundo sobre a verdadeira origem dos problemas na ilha.

O trauma acumulado por décadas de crises energéticas, falta de alimentos e condições de vida precárias tem sido instrumentalizado pelo regime para criar uma narrativa na qual os cubanos são vítimas de um inimigo externo, mas também, heróis de uma resistência sem fim. Essa dualidade alimenta um sentido de propósito e pertencimento que, ao mesmo tempo que fortalece o espírito, impede a mudança real e perpetua o controle sobre um povo que, geração após geração, aprendeu a viver com o trauma como sua única constante.

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