Cubano Georvis Elias triunfa aos 42 anos no basquete espanhol (ENTREVISTA)

"Toda a minha vida profissional foi realizada na Espanha, foi difícil sair daqui."

Basquetbolista cubano Georvis Elias © Cortesía CiberCuba
Basquetebolista cubano Georvis EliasFoto © Cortesia CiberCuba

Vídeos relacionados:

A sala "Rafael Castiello", na capital guantanamera, fervia como água a mais de 100 graus centígrados. Milhares de fãs pendurados em janelas, torres e até no teto acompanhavam com paixão as incidências da Liga Superior de Basquete.

Não por acaso batizada como a Caldeira de San Justo, muitos dos melhores jogadores da década de 2000 se envolviam em intensos duelos; entre eles, Georvis Elias, um rapaz robusto de dois metros e 100 quilos que, aos 42 anos, ainda joga na liga espanhola do esporte das cestas.

Julita, embora pareça inacreditável, ainda jogo aos 42 anos no clube de Basquetebol Daimiel, em Ciudad Real, e me mantenho, agora com meus 105 quilos de fibra hahaha.

Saí de Cuba em 2009 para jogar um amistoso contra aquela grande seleção espanhola liderada pelos irmãos Gasol e companhia, em Las Palmas de Gran Canaria. Para mim, sempre foi uma viagem sem retorno, porque já tinha decidido… queria ser livre!

E como tem sido a sua experiência na Espanha? Como foi o seu acolhimento na Ilha?

Em Gran Canaria, existe uma comunidade cubana muito grande e, desde o início, fomos muito bem recebidos. Falo no plural porque você deve se lembrar que éramos quatro: os pivôs Georfry Silvestre e Grismay Paumier, e o armador Taylor García. Estávamos em casa, como se costuma dizer.

E você me diz que antes de ir embora tinha decidido ficar?

Foi uma decisão tomada em Cuba entre meu irmão, o Gato Silvestre, e eu. Éramos os que mais tempo estávamos na seleção, e a nós se juntaram dois jovens, Paumier e Taylor, como te disse.

Tudo correu bem. No início, um pouco nervoso, você pode imaginar a mudança de vida que se impõe: sem sua casa, sem sua família, sem seus amigos, sem seu país, mas nunca com arrependimento. Exatamente duas semanas após minha chegada, apareceu o grande Aroldis Chapman, que havia deixado o time na Holanda, antes de começar o tradicional torneio de Rotterdam.

Com Aroldis Chapman, Taylor García e Grismay Paumier / Cortesia do entrevistado

Como ele encontrou vocês?

Porque a notícia da nossa decisão ecoou, e realmente ecoou! Foi um acontecimento midiático: dos doze jogadores, quatro ficam na Espanha.

Tiraram uma foto nossa em um bar e assim Aroldis nos localizou. Ele ainda não sabia seu destino e, de forma desinteressada, nos ofereceu sua ajuda. Desde o primeiro momento, ele fez tudo por nós. Nunca esquecerei esse gesto, assim como o do pugilista Yuriorkis Gamboa, que também nos apoiou. Ficamos meses entre Barcelona e Andorra até que Aroldis partiu para os Estados Unidos.

Como você conseguiu se manter em forma?

Deixe-me te contar: me chamam de "o trem de Guantánamo" por meu físico invejável, musculoso e atlético. É verdade que cuido de mim, mas você imagina quem eu seria agora em Cuba? Pelo amor de Deus! Se até superestrelas são esquecidas. Eu seria, no máximo, treinador na EIDE do Guaso. Ficar aqui foi a melhor decisão da minha vida. Eu me cuido muito, mantenho-me: exercícios, alimentação saudável. Tenho o que preciso.

Atualmente, onde você mora?

Toda a minha vida profissional foi realizada na Espanha, e me custou sair daqui. Sou do tipo que, se está bem em um lugar, não se movimenta. Atualmente, como mencionei, jogo no clube Basquetebol Daimiel e moro em Ciudad Real, uma cidade localizada a uma hora e meia de Madri.

Também joguei no clube Albacete de Castilla-La Mancha, onde sou o jogador que mais pontos, rebotes e assistências acumulou. Na verdade, tenho uma camiseta pendurada na parede da quadra, uma homenagem feita aos melhores. Com o Albacete, estive quatro anos e já estou há cinco com o Daimiel.

Quando decidi viver nas Canárias, joguei em equipes de Lanzarote e de Tenerife. Em 2012, estive prestes a integrar o time de Gran Canaria da primeira divisão, mas meus documentos ainda não estavam regularizados como cidadão espanhol e, ocupando uma vaga de estrangeiro, era muito difícil.

Primeiros passos, primeira quadra, primeiro treinador? Você sempre foi jogador de basquete?

Meus começos em Cuba remontam aos meus 8 anos; eu treinava na mítica caldeira de San Justo. Meu primeiro treinador, e aquele a quem mais agradeço, se chama Antonio Martín, a quem devo tudo. Só pratiquei basquete, apesar de muitas tentativas frustradas de me desviar para o vôlei.

Guantánamo é uma província que ama o basquete. Nossos jogadores viveram sua época de ouro nos anos 80, quando foram campeões nacionais da primeira categoria por três vezes. Além disso, quando foi criada a Liga Superior, formaram uma magnífica parceria com os santiaguenses e surgiram aqueles Orientais que proporcionaram tantas batalhas memoráveis, principalmente contra os Capitalinos.

O basquete era e é a paixão de muitos na minha terra natal; no meu caso, desde os 8 anos não largo a bola. Jogava-se em todo lugar e, além disso, tínhamos a sorte de poder assistir a jogos universitários e da NBA, o melhor basquete do mundo, pelo canal da base naval que, naquela época, chegava a todos os receptores de televisão da província.

Tudo isso contribuiu para que o basquete entrasse nas minhas veias como o sangue que você precisa para viver. Foi assim que participei com sucesso de jogos pioneiros, escolares e juvenis. Veja se eu era bom: com apenas 15 anos, nem estava no primeiro ano juvenil, me levaram a um torneio de primeira categoria e foi incrível.

Guantánamo tinha uma ótima equipe, composta por figuras de destaque do basquete nacional, liderada por Roberto “a Pedra” Simón, um excelente pivô, a quem aprecio muito e que sempre me ajudou e aconselhou.

La Piedra é o pai dessa cátedra do vôlei mundial que é Roberlandy Simón, que hoje é uma peça fundamental da seleção cubana que aspira a participar de Paris, dando tudo na Liga das Nações. Mas bem, vamos voltar ao menino Georvis.

Posso te dizer que eu era o típico "garoto" da equipe naquele começo, mas aconteceu um imprevisto, por assim dizer: jogando nas semifinais, se não me engano contra os Capitalinos (que equipe fantástica! O que posso te contar que você já não saiba), houve um momento em que vários jogadores saíram por conta de faltas acumuladas e Humberto Soler, que estava em ótima forma, se machucou no pulso.

Praticamente não havia outra opção: entrei em campo e foram aqueles minutos que marcaram minha consagração, joguei até de armador sendo ala. Foram apenas alguns minutos, calçava meus "tênis matanceros", mas impressionei.

Depois participei do meu primeiro Campeonato Nacional Juvenil e foi quando fui promovido para a ESPA nacional em Havana del Este. Fiquei lá por dois anos, até que, aos 18 anos, fui convidado para a seleção nacional no Cerro Pelado.

Georvis não diz isso por modéstia, algo que sempre o caracterizou, mas durante esses dois anos na ESPA nacional, ele me ajudou muito, cuidando do meu filho Julito como um irmão mais velho. Julito é tenista, pequeno, magro e propenso a ser "a bola" do grupo; no entanto, sempre havia os basquetebolistas ao lado do meu entrevistado de hoje, protegendo o menor dos meus filhos... coisas que não se esquecem, não é mesmo?

Georvis, como foi para você no Cerro Pelado?

O caminho não foi nada fácil, pois vivemos uma época difícil. Em 1999, ficaram aqueles monstros do basquete cubano liderados por Lázaro Borrel, Ángel Oscar Caballero e Roberto Carlos Herrera, que descanse em paz.

Então, a geração que vinha atrás, à qual eu pertencia, teve que "pagar o pato". Eu entrei para a seleção em 2000 e meu foco era somente treinar, treinar e treinar, sem nenhuma experiência internacional. Nosso único objetivo era a Liga Superior de Basquete (LSB), consegue imaginar?

Estive no Cerro Pelado até 2009 e, durante todo esse tempo, fui dirigido por Daniel Scott e Leonardo Pérez: eu teria adorado ter Miguelito Calderón como treinador, mas ele já não estava.

Para mim, ele era o melhor treinador da época. Sei que com ele eu poderia ter explorado ainda mais o meu basquete; não acredito que ele se preocuparia com trivialidades como: "não deixe a barba, não faça tatuagens, não use essas roupas", que tanto me incomodavam naqueles tempos.

Portanto, nesse período de nove anos no Cerro Pelado, nem tudo foi um mar de rosas. Embora me desse bem com todos, tanto no meu esporte quanto entre todos, vivi muitos momentos difíceis. Houve um tempo em que, se você não risse com o treinador ou "não fizesse a média", como se diz aqui na Espanha, não era do seu agrado. Tive que suportar bastante, mas graças a Deus, tudo isso me ajudou a me tornar quem sou hoje... um homem livre!

Muitas vezes, nós, jornalistas, vamos fazer a entrevista ou a matéria e esses aspectos mais íntimos ficam de lado. No entanto, devido ao carinho que tenho por ele, fiquei sabendo de algumas dessas questões, que hoje podem ser reveladas, mas na época ter divulgado teria sido prejudicial para ele. Enfim!

Você sempre jogou como três, ou seja, como ala?

Sempre joguei como três, é a posição que mais gosto, embora pudesse atuar em até três posições: três, quatro e cinco, ou seja, ala, ala-pivô e pivô; aqueles que me conhecem bem sabem do que estou falando. Veja que agora estou jogando nas posições quatro e cinco; é o que a equipe precisa e é aí que estou.

Quais são os principais eventos internacionais?

A experiência mais significativa que tive com a seleção nacional foi nos Jogos Centro-Americanos e do Caribe de Cartagena das Índias 2006, na Colômbia. Apesar de não ter subido ao pódio, pude estar rodeado dos melhores atletas de Cuba, foi uma bênção.

Qual é a sua lembrança mais bonita do basquete cubano?

Uff! Julita lembra que o basquete e sua LSB chegaram não para se igualar, mas para superar em espetacularidade a Série Nacional de Beisebol. As pessoas enlouqueciam, as instalações estavam lotadas, toda a torcida super envolvida; foram momentos incomparáveis. Aquela Caldeira de San Justo, com pessoas em cima dos telhados!

E quando eu fiquei, lembro como os fãs escreviam para mim dizendo que não queriam mais assistir basquete em Guantánamo. E, de fato, minha querida Caldera de San Justo nunca mais se encheu. A verdade é que eu lia os e-mails e as lágrimas saltavam dos meus olhos.

As coisas mudaram muito agora. Felizmente, surgem jogadores com contratos, seja por conta própria ou pela Federação. Isso, na minha época, não existia; além das mentiras que nos contavam, pois Silvestre e eu ainda estamos esperando o contrato na Rússia, que tanto nos prometeram.

Pelo menos agora, embora não sejam todos os que desejaríamos, há alguns que conseguiram jogar no exterior e, assim, contribuem para a melhoria do nosso basquete, e, claro, em benefício próprio.

A nível interno, realmente é mais difícil que consigamos ver aquelas intensas jornadas de bom basquete novamente, pois todos sabemos que faltam muitos recursos e talvez até vontade. Mas, enfim, é o que temos e, por que não?, o que nos falta: transporte, alimentação, hospedagem, condições deprimentes das quadras, incluindo as tabelas e as bolas.

Quão verdadeiras são suas palavras! Que desejos você tem para os cubanos classificados em Paris?

Julita, sou fã do meu povo de Cuba, não importa o esporte, não importa o país em que competem. Sempre vou desejar o melhor, pois sei da humilde origem da qual a grande maioria saiu. Nas Olimpíadas, apoiarei todos os cubanos, independentemente de onde competirem.

Você é feliz, sente-se realizado?

Pois é, pessoalmente me sinto realizado. Consegui fazer minha carreira fora de Cuba. Como te disse, tenho minha camisa pendurada em um pavilhão aqui na Espanha, e isso, você sabe, é feito para as lendas.

Outro sonho realizado foi jogar com um cubano, neste caso um guantanamero como eu, o ala Raudelis Guerra, que ficou em uma escala da seleção nacional em Madrid, há quase três anos. Ele esteve comigo por dois anos e agora está jogando em Córdoba, Andaluzia.

Quando vem Georvis Junior?

Jajajaja, em breve! Você será a primeira a saber. E como sempre, agradeço por não ter me esquecido. Mande lembranças para o Lolo (Julito) Jajajaja.

Comentar

Arquivado em:

Julita Osendi

Graduada em Jornalismo na Universidade de Havana em 1977. Jornalista, comentarista esportiva, locutora e realizadora de mais de 80 documentários e reportagens especiais. Entre minhas coberturas jornalísticas mais relevantes estão 6 Jogos Olímpicos, 6 Campeonatos Mundiais de Atletismo e 3 Clássicos

Julita Osendi

Julita Osendi

Graduada em Jornalismo pela Universidade de Havana em 1977. Jornalista, comentarista esportiva, locutora e responsável pela realização de mais de 80 documentários e reportagens especiais. Entre as minhas coberturas jornalísticas mais relevantes estão 6 Jogos Olímpicos, 6 Campeonatos Mundiais de Atletismo e 3 Clássicos