O sacerdote cubano Alberto Reyes, um crítico feroz do regime, afirmou que a mudança social em Cuba deve surgir do povo e não virá espontaneamente daqueles que governam, porque a sua realidade é tão diferente que lhes é impossível empatizar com o sofrimento das pessoas.
O Padre Reyes, da diocese de Camagüey, compartilhou nesta sexta-feira um texto em sua página do Facebook no qual denuncia que o governo está cada vez mais desinteressado e alheio às necessidades das pessoas, e chama o povo, cada vez mais sufocado e desamparado, a romper com o "espírito de escravidão" que o domina.
Reyes destaca que aqueles que dirigem o país acreditam que devem estar no poder e se consideram uma elite intocável, e critica que se alguém se digna a se aproximar das pessoas comuns, são recebidos como deuses, sendo elogiados e aplaudidos.
A seguir, CiberCuba compartilha o texto íntegro da publicação.
Tenho estado a pensar... (LXXII) por Alberto Reyes Pías.
Tenho estado a pensar por que é que a mudança social tem de surgir do povo.
Gosto de soluções, de resolver problemas, de superar desafios, mas entendo que nem sempre é fácil.
Como resolver o divórcio entre o Governo e o povo, um Governo cada vez mais desinteressado e alheio às necessidades das pessoas, um povo cada vez mais sufocado e indefeso? Como quebrar esse espírito de escravidão que nos faz cerrar os punhos de raiva dentro de casa e lidar com sorrisos e mentiras complacentes com aqueles que diariamente nos roubam a vida?
Nem sempre sou capaz de gerar soluções, mas há algo que sempre é possível e é ajudar a pensar, ajudar a ter, pelo menos, ideias claras. E uma ideia que devemos ter clara é que a mudança desta ilha não virá espontaneamente daqueles que hoje nos governam.
Não podem vir deles porque a sua cotidianeidade é diversa da nossa, e isso os impossibilita de se conectarem com os nossos sofrimentos.
Quando não falta eletricidade, não se sofre com o calor, o leite das crianças não estraga, e as noites não são um inferno de calor e mosquitos... Não se pensa naqueles que passam noite após noite sem descanso e têm que enfrentar o novo dia do esgotamento.
Quando a comida não é um problema, o dinheiro não falta, a atenção médica está garantida, a mobilidade de um lugar para outro não é angustiante... aprende-se a encarar essa vida como 'normal', e os pobres, os necessitados, os 'de a pé', tornam-se conceitos abstratos, seres sem rosto.
Quando se cresceu com a mentalidade de que o poder é devido e se estabeleceu no mais profundo das neurônios que se pertence a uma classe diferente, a uma elite intocável... 'as massas', 'o povo', tornam-se palavras para discursos vazios e uma ameaça intolerável se pretendem mudar as coisas.
Quando se cresce sem Deus, quando a Bíblia é um livro desconhecido e Cristo não passa de uma superstição incompreensível e perturbadora; quando Deus não entra na equação da vida e não é visto como o Pai que faz enxergar o próximo como um irmão... então o poder desumaniza, e a alma se torna insensível aos gritos do pobre.
Por outro lado, quando alguém se digna a se aproximar das pessoas que vivem no mundo real, e é recebido como um deus, e é elogiado, aplaudido, adorado... não importa se por medo, estratégia ou doutrinação; quando são levados através de fogos de artifício e ninguém ousa dizer-lhes que 'o rei está nu', a mensagem de submissão e escravidão não poderia ser mais clara e reconfortante.
Eu não sei como conseguiremos fazer com que as coisas mudem, mas a mudança não virá espontaneamente daqueles que nos governam, pois para eles, uma mudança não é necessária nem prática; para eles, o povo é apenas uma desculpa para sua vida perfeita; para eles, nós não importamos.
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