Miami, 4 de dezembro (EFE) - A Cuba do "Período Especial" foi a que a fotógrafa americana Tria Giovan registrou com sua câmera, e é a mesma que agora aparece retratada no livro "The Cuba Archive".
Para a artista radicada em Nova York, este livro de 167 páginas, com formato paisagem e em cores, apresentado em Miami no último fim de semana, constitui "uma documentação histórica" de "um dos momentos mais difíceis de Cuba", disse em uma entrevista à Efe.
"O Arquivo de Cuba" é o resultado de seis anos de trabalho. Reúne imagens das doze viagens que fez a Cuba entre 1990 e 1996, onde visitou lugares que nunca haviam sido fotografados por um estrangeiro devido à falta de um aparente atrativo turístico.
"Também captura momentos íntimos e informais", destacou Giovan, muito emocionada por apresentar seu trabalho em Miami, a cidade fora de Cuba onde vivem mais cubanos.
"Sé que naquela época era muito difícil para um americano viajar para Cuba, por isso foi uma sorte que me deixaram assistir ao momento da queda econômica do país", indicou.
"Obtive o visto de pesquisadora, embora não tenha explicado na época que tipo de pesquisa iria realizar", declara Giovan, que cresceu nas Ilhas Virgens Americanas e sempre teve o desejo de visitar o contexto caribenho "socialista".
Um olhar para a câmera consentido, mas invariável a expressão desde o momento em que ela solicita a permissão até o momento em que pressiona o obturador, deixa nestas páginas um sentimento de solidão e ingenuidade que a autora trabalhou conscientemente.
"Todo mundo esperava em filas para conseguir algo. Os ônibus estavam lotados de gente. Para mim, era mais fácil me deslocar porque eu tinha dólares", indica Giovan, que visitou inúmeros vilarejos e províncias do interior cubano com uma amiga, também fotógrafa, em um carro alugado, conduzido por elas.
"Fazíamos 'carona'. Fomos taxistas incontáveis vezes porque nos dava vergonha das facilidades que tínhamos", recapitula.
O livro, preparado pela editora italiana Damiani, captura desde a desolação de uma paisagem até danças populares e trajes de domingo que não escaparam ao olhar "atrevido" desta fotógrafa profissional.
Giovan capturou as possivelmente últimas faixas publicitárias que o governo comunista utilizou e ainda utiliza para exaltar seu sistema social e político, deixando a autora uma sutil ironia em imagens como aquela onde se lê a legenda: "À revolução e ao socialismo devemos hoje tudo o que somos".
Uma Cuba desbotada, desgastada e solitária é a que deixa Giovan, não sem antes entregar por escrito uma dedicatória na primeira página: "P pelo futuro de Cuba".
A autora gosta de pensar que muitas das meninas que aparecem ao lado de sua família ou sozinhas no livro "hoje devem ser mulheres e não sabemos se ainda estão lá".
"Escaneei tudo. Os negativos se deterioraram e precisei revisá-los para preservá-los. Por isso se chama 'Arquivo'. Originalmente encontrei cerca de 25.000 fotogramas. Depois fiz uma triagem e fiquei com 1.000 imagens digitalizadas, e mais tarde com 600."
"No final, fiquei com 200 para terminar em 125, que é o que está no livro", indica Giovan.
A tarefa de "resgate" foi realizada vinte anos depois e, conforme lembra, a motivação surgiu de uma notícia que viu sobre Cuba na televisão.
"Recordo que tudo começou em uma noite muito fria em Nova York. Olhei para as caixas em minha casa que diziam 'Cuba anos 90' e comecei a revisar os negativos. Encontrei coisas que antes não tinha visto. Meu olhar havia amadurecido, comecei a prestar atenção em fotografias que nunca havia notado", relembra.
À autora, que neste momento participa com sua obra na exposição coletiva de fotografia "Cuba Is", no Annenberg Space for Photography de Los Angeles, Califórnia, gostaria muito que seu livro fosse apresentado em Cuba.
"Agora vejo isso como possível. Eu gostaria. Sei que em relação a Cuba há pessoas com sentimentos muito fortes, e posso entender isso. Espero que não incomode o Governo cubano, pois não há má vontade neste projeto", afirma Giovan.
A artista apresentou neste domingo seu arquivo "depurado" na livraria Books & Books, em Coral Gables, cidade vizinha a Miami, onde autografou exemplares e revelou detalhes, como o fato de ter trabalhado com filme colorido de forma intencional para capturar o "desbotado" das fachadas e letreiros.
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